POMPÉIA, 79 d.C., ITÁLIA
Na manhã do dia 24 de agosto de 79, o céu estava azul. Nenhuma nuvem. O sol muito quente resplandecia, clareando as aldeias e as vivendas, brilhando sobre Pompéia, sobre Herculano, sobre Miseno e sobre Nápoles, ofuscando com seus raios a brancura dessas cidades.
Em Pompéia, na vivenda de Diomedes, onde se fazia o comércio de vinho, perto dos Sepulcros, cada um cuidava de sua ocupação. A dona da casa encontrava-se no jardim, em companhia do filho e da filha. Era alta e bela. Vestida elegantemente, usava no pescoço um pesado colar de ouro e os pulsos estavam repletos de braceletes. Ela gostava daquele lugar cercado, íntimo, recolhido, protegido dos ventos e da curiosidade dos vizinhos. Ali, mandara plantar com simetria plantas e flores, entre as quais predominavam violetas, rosas e lírios. Minúsculas aléias e ornamentos de mármores se viam através de arbustos, próximos uns dos outros e dispostos em igual distância; outros ornamentos de mármore estavam colocados sobre o pórtico, que era sustentado por uma série de colunas. No centro do jardim, uma pequena fonte com um chafariz proporcionava um pouco de frescor.
Os pássaros emudeciam
A dona da casa estava nervosa. Há quatro dias, ouviam-se estrondos para os lados do Vesúvio, registravam-se tremores de terra. Ela soubera que nas vivendas situadas nas encostas próximas ao vulcão muitas paredes racharam, objetos haviam tombado e poços haviam secado. O mar, habitualmente tão calmo, achava-se agitado e ondas violentas varriam as praias. A dona da casa notara que os pássaros emudeciam, pássaros que normalmente enchiam-lhe o jardim de cantos; as aves voavam em pânico. Seus dois cães latiam sem motivo.
No entanto, naquela manhã de 24 de agosto de 79 tudo estava calmo.
Subitamente, duas horas antes do meio-dia, um grande abalo sacudiu o chão e, vinda do Vesúvio, ouviu-se uma formidável detonação. As crianças precipitaram-se sobre a mãe, gritando e agarrando-se a ela. Malgrado seu próprio terror, a mulher procurou acalmá-las e arrastou-as na direção da casa.
Foi então que, levantando os olhos, viu estupefata que o cume do Vesúvio havia-se partido em dois. Sucedendo aos fragores das explosões, uma coluna de fumaça subiu aos céus e desapareceu, substituída por um imenso cogumelo de fumo negro.
Junto com o filho e a filha, a mulher de Diomedes entrou na casa. Os escravos corriam para todos os lados. Um deles aproximou-se, tendo aos braços o filho mais novo de sua ama, um menino de oito meses, que ela pegou e apertou com ternura contra o peito.
Um tumulto apocalíptico
Detonações ensurdecedoras ribombavam.
Começaram a chover torrões de terra, pedras, escórias, lapili (pequenos blocos de projeções vulcânicas), poeira vulcânica, de maneira tão abundante que o sol escurecia cada vez mais. A noite caiu em pleno dia, riscada de lívidos relâmpagos.
Desta vez não havia dúvida: os deuses do Olimpo desciam sobre a Terra para punir os homens. Eles iam fazer o universo sossobrar no caos.
Para onde fugir, aonde ir, quando tudo se transformava em escombros, quando o sol desaparecia do céu e a Terra era sublevada num tumulto de apocalipse? A chuva de escórias e de lapili enterrava tudo.
As mulheres e as crianças gritavam. Cada qual clamava pelos mais próximos, alguns suplicavam aos deuses. Somente o senhor da vivenda conservava o sangue-frio. Dava ordens: que todos se refugiassem no criptopórtico!
A casa, além do peristilo, possuía uma grande passagem abobadada, a que se tinha acesso por uma escada, e que deixava passar a luz do dia através de estreitas janelas que davam para o jardim. Neste criptopórtico, conservavam-se as ânforas de vinho, cuja base pontiaguda era enfiada no chão. As abóbadas, aos olhos do proprietário, deviam ser suficientemente sólidas para garantir a segurança da gente da casa. Foi para lá que ele levou a famílias e os criados que encontrou. Depois, fez levar ao abrigo pão, frutas, água e outras provisões. Ele próprio enfiou dentro de um saco de pano grosso 10 peças de ouro e 88 moedas de prata com a efígie de Nero, de Vespasiano e de Vitélio.
Os lapili, lá fora, acumulavam-se. As pedras pulverulentas penetravam por toda parte. Vez por outra, blocos de seis a dez quilos caíam sobre a cidade com um baque surdo. Sob o choque, alguns telhados ruíram.
A chuva, misturada às cinzas, começou a cair.
Asfixia por gases deletérios
O dono da casa, com uma chave na mão, dirigiu-se então para a porta de saída. Um escravo, homem de confiança, carregado de prataria, acompanhou-o. Entendiam eles assegurar-se de que do lado do mar a fuga era possível, antes de voltarem para buscar os demais ocupantes do criptopórtico. A morte os esperava na soleira. O senhor e o escravo tombaram sem vida sobre a camada de cinzas e pedras, que já atingia mais de um metro: foram asfixiados pelos gases venenosos que o vento espalhava.
Por sobre o Vesúvio, retorciam-se as labaredas que a cratera do vulcão deixava escapar. Por um momento, a noite opaca e úmida, saturada de enxofre, foi iluminada. Espetáculo infernal!
No criptopórtico, suplicavam aos deuses, mas os deuses mantinham-se surdos. As cinzas penetravam rapidamente pelas aberturas, ao mesmo tempo em que as emanações deletérias, tanto mais nocivas porque a ventilação era nula. As 18 pessoas que se amontoavam no criptopórtico iriam morrer, tentando lutar contra a asfixia, após terem tapado o nariz e a boca. A jovem filha procurou proteger a cabeça com a túnica de precioso linho, que levantou sem se preocupar ao se mostrar nua até a cintura. A morte surpreendeu-a nesta postura. Não longe dela, duas jovens escravas abraçaram-se cerrando os peitos. Assim pereceram, coladas uma à outra. A senhora da casa morreu apertando contra os seios o filhinho de colo, com o mais velho ao lado, segurando-lhe a barra da túnica. No alto da escada, a cabra, tendo ao pescoço um sinete, jazia a poucos metros dos dois cães que, acorrentados, não puderam fugir.
A morte assolava a cidade.
O tempo passava. A camada de lapili já atingia os telhados. As ruas e vielas estavam cheias de matéria vulcânica, à qual se juntava a cinza úmida. Três horas após o meio-dia, o sepultamento de Pompéia era total. Toda espécie de vida havia desaparecido. Emergindo daquele oceano de desolação e das escórias, restavam apenas alguns panos de muros. Parte do Fórum ainda de pé, com mais de cinco metros de altura, também resistiam – últimos vestígios de uma cidade feliz e florescente.
Havia um repórter no local
No primeiro século de nossa era, como ainda não existia nem cinema nem televisão, nenhuma câmara registrou o terrível cataclismo. Entretanto, havia um repórter no local: Plínio, o Jovem, então com 18 anos de idade. Testemunha ocular, ele relatou a tragédia em duas cartas endereçadas a seu amigo, o historiador Tácito. Este, desejoso de retraçar a história da grande catástrofe, havia pedido o testemunho do amigo.
Notemos, entretanto, que o escritor não fora a Pompéia em pessoa. Plínio, o Jovem, e seu tio Plínio, o Velho, o grande naturalista, estavam em Miseno, em agosto de 79. Sabemos que o cabo de Miseno fecha o golfo de Nápoles a noroeste, a cerca de 40 quilômetros de Pompéia. Augusto estabelecera ali a base da frota encarregada por Roma de policiar o Mediterrâneo. Conseqüentemente, os dois Plínios não puderam assistir às duas primeiras fases da erupção: primeira fase, às 10 horas, o lançamento da camada de lava; segunda fase, às 10h15min, a poeira fina espalhada pelo vento e os gases tóxicos. Somente às 13 horas é que eles foram alertados, isto é, no momento da terceira fase. De Miseno, Plínio, o Velho, na ocasião comandante-em-chefe da frota de Miseno (praefectus clasis Misenensis), observou, saindo do Vesúvio, uma nuvem em forma de pinheiro, no interior da qual se encontravam a cinza e a terra que completaram o enterramento de Pompéia.
Entretanto, o testemunho de Plínio, o Jovem, único, tem um valor considerável. Não podemos deixar de citar as principais passagens das duas cartas enviadas a Tácito.
Eis a dupla reportagem de Plínio, o Jovem:
“Vós me pedis a descrição do fim de meu tio para poder transmiti-la com maior veracidade à posteridade: eu vos agradeço; desse modo, prevejo que sua morte, glorificada através de vossas obras, beneficiar-se-á de uma glória imortal. Com efeito, se bem que ele tenha perecido simultaneamente com povos e cidades durante um cataclismo que se abateu sobre as mais belas regiões, este memorável acontecimento de certa maneira lhe assegura a imortalidade. E, se bem que ele próprio tenha escrito numerosas obras destinadas a permanecerem, seu futuro durará tanto mais que a elas se juntará a eternidade reservada a vossos escritos.
Quanto a mim, julgo felizes os homens aos quais os deuses concederam a graça de realizar ações dignas de serem registradas por escrito ou de escreverem livros dignos de serem lidos; mas felizes entre todos aqueles que receberam esta dupla graça. Entre estes incluirei meu tio, graças aos seus livros e aos vossos. Aceito de muito bom grado e até reivindico o que vós me impondes.
Ele se achava em Miseno e comandava pessoalmente a frota. No nono dias antes das calendas de setembro (24 de agosto), por volta da sétima hora (13 horas), minha mãe lhe faz saber que surge uma nuvem de tamanho e aspecto excepcionais; meu tio havia tomado banho de sol, depois banho frio e, tendo feito uma refeição ligeira, trabalhava descontraído; pediu os calçados e subiu a um local de onde se podia melhor observar esse prodígio. Levantava-se uma nuvem (de longe era impossível saber-se de que montanha; depois se soube que se tratava do Vesúvio). Parecia exatamente um pinheiro. De fato, estirada numa espécie de tronco muito comprido, espalhava-se no ar em ramificações; creio que havia sido levado por uma corrente de ar recente e depois, ao cessar esta última, a nuvem, abandonada, ora branca, ora cinzenta e malhada, conforme estivesse carregada de terra ou de cinzas”.
Uma palavra de Rectina, mulher de Cascus
“Ao meu tio o fenômeno pareceu importante e digno de ser estudado mais de perto: era a atitude natural de um sábio.
Fez armar uma galera liburniana (cruzador leve com duas fileiras de remos) e deu-me a liberdade de acompanhá-lo se eu o quisesse; respondi que preferia estudar e ele mesmo indicou-me o assunto de que eu deveria tratar. Ele saía de casa quando recebeu um recado de Rectina, mulher de Cascus, assustada com o perigo que a ameaçava: de fato, sua vivenda estava localizada em nível inferior ao vulcão e ela não tinha outra fuga senão pelo mar, suplicando a meu tio que a salvasse de destino tão funesto. Meu tio mudou de idéia e o que havia começado pelo amor da ciência ele terminou com o sentimento mui elevado do dever. Fez sair os quadrirremes, ele próprio embarcou, decidido não somente a socorrer Rectina, mas também outras pessoas (na realidade, os encantos do litoral atraíam muita gente). Apressou-se rumo ao local de onde outros fugiam e manteve o remo de sua embarcação alinhado na direção do perigo, tão isento do medo que todas as fases desta catástrofe, todos os seus aspectos, contanto que os tivesse visto, meu tio os ditava ou os escrevia ele mesmo”.
“A fortuna favorece a coragem”
“As cinzas já começavam a cair sobre o navio; à medida que seus ocupantes se aproximavam, as cinzas tornavam-se mais quentes e densas; viam-se já as pedras-pomes, seixos pretos queimados, expelidos pelo fogo; um baixio acabara de surgir e as rochas desabadas interditavam as margens. Ele hesitou por um momento: recuaria ele? A seu piloto, que a isto lhe aconselhava, disse ele: ‘A fortuna favorece a coragem; tome o rumo da habitação de Pompanianus’. Este último estava em Stabia, separada de sua moradia pela metade do golfo (naquele local, o litoral tem forma redonda, em suave curva, que o mar penetra). Naquele lugar, embora o perigo ainda não se tivesse dele aproximado, apesar de ser visível e de que, aumentando de intensidade, chegava cada vez mais perto, Pompanianus havia ordenado carregar os navios com sua bagagem, decidido a fugir assim que o vento virasse; este vento muito favorável empurrava meu tio, que beijou o amigo trêmulo, consolou-o, encorajou-o. E, para que sua firmeza atenuasse-lhe os temores, desceu para banhar-se; uma vez limpo, pôs-se à mesa, comeu com prazer ou, o que era igualmente magnânimo, afetou prazer.
Durante esse tempo, o Vesúvio brilhava em vários lugares com chamas imensas e altas colunas de fogo de cores vivas. A claridade era acentuada pelas trevas da noite. Meu tio, entretanto, para acalmar o temor, repetia que eram fogueiras deixadas acesas por camponeses apressados ou vilas abandonadas que se incendiavam. Nesse momento, ele se entregou ao repouso e dormiu um sono autêntico. Sua respiração, profunda e sonora devido à sua corpulência, era ouvida pelos que passavam pela porta do quarto. Mas o pátio por onde se tinha acesso aos seus aposentos já estava cheio de cinzas e de pedras-pomes, elevando o nível do chão a tal ponto que, se meu tio tivesse ficado mais tempo no quarto, não teria podido sair. Acordado, levantou-se e foi ao encontro de Pomponianus e dos outros, que haviam ficado acordados a noite toda. Todos deliberaram de comum acordo: ficar dentro da casa ou sair?
As casas vacilavam depois de freqüentes e graves tremores de terra; abaladas em seus alicerces, pareciam balançar de um lado para outro. Ao ar livre, por outro lado, temia-se a queda de pedras-pomes, embora fossem leves e porosas. Foi a isto que todos preferiram depois de compararem os perigos. Quanto a meu tio, a proposta mais razoável venceu; quanto aos outros, venceu o medo maior. Colocando travesseiros sobre a cabeça, amarraram-nos com fronhas e lençóis; isto servia de proteção contra tudo que caía do alto”.
Levantou-se e logo caiu
“O dia já estava claro em todas as partes, mas aqui era a noite mais tenebrosa, mais negra que todas as outras noites. No entanto, numerosas vermelhidões e luzes variadas suavizavam-na. Foi decidido ir-se até a praia e ver de perto se era possível sair navegando. O mar continuava agitado e adverso. Repousando sobre um lençol, várias vezes meu tio pediu água e bebeu. Depois as labaredas e o odor de enxofre que as anunciava afugentaram seus companheiros e o acordaram. Apoiando-se em seus dois jovens escravos, levantou-se e logo caiu. Suponho que a fumaça muito grossa obstruiu-lhe a respiração e fechou-lhe a laringe que, por natureza, ele tinha estreita e freqüentemente oprimida. Quando nasceu o dia (era o terceiro desde o último que ele vira), seu corpo foi encontrado intacto, em perfeito estado e coberto com as vestimentas que havia posto ao partir. Sua atitude assemelhava-se mais à de um homem que repousa do que à de um morto.
Durante esse tempo, em Miseno, minha mãe e eu... Mas isto nada tem a ver com o caso e vós não quisestes saber outra coisa que não a morte de meu tio. Portanto, vou terminar. Acrescentarei apenas que vos contei tudo a que assisti e que me foi relatado imediatamente, quando os relatos são mais exatos. Vós fareis a seleção que vos aprouver. Escrever uma carta é uma coisa, outra coisa é escrever uma página de história; escrever a um amigo é coisa diferente de escrever para o público. Adeus!”
Tudo parecia não tremer, mas girar
Na segunda carta, escrita sem dúvida depois de novo pedido do historiador Tácito, Plínio, o Jovem, faz o relato dos perigos aos quais ele próprio e sua mãe escaparam.
“Vós me direis que a carta em que, a vossas instâncias, eu vos contei a morte de meu tio levou-vos a desejar saber que temores e mesmo que perigos eu enfrentei, eu que ele deixou em Miseno (de fato, eu havia chegado lá quando interrompi a missiva).
Se bem que meu coração treme com tais lembranças, recomeçarei.
Após a partida de meu tio, passei todo o resto do tempo estudando (aliás, eu havia permanecido com este objetivo); logo depois tomei banho, jantei e deitei-me para um sono curto e agitado. Durante muitos dias, como sinais de advertência, registraram-se abalos telúricos menos assustadores porque já estávamos habituados a isto na Campânia. Mas naquela noite estes abalos assumiram tamanha intensidade que tudo parecia não tremer, mas girar. Minha mãe precipitou-se dentro do meu quarto onde, de minha parte, eu já estava de pé e decidido a ir acordá-la. Sentamo-nos no pátio da casa, exíguo espaço que separava a casa do mar. Hesito em falar de minha autoconfiança ou de minha imprudência (afinal, eu tinha meus 18 anos); eu implorei um livro de Tito Lívio e, como se estivesse em período de lazer, li e fiz até resumos, conforme havia começado. Chegou um amigo de meu tio, que acabava de regressar da Espanha para vê-lo. Quando me viu sentado em companhia de minha mãe, e me viu lendo, censurou minha passividade e minha indiferença com tanta veemência que eu permaneci atento à leitura.”
Muitas surpresas, muitos sobressaltos
“Já era a primeira hora do dia e a claridade ainda era incerta e quase doentia; o casario já se espreguiçava e, apesar de estarmos ao ar livre, a estreiteza do lugar nos fazia temer grandes e inevitáveis perigos em caso de desabamento. Foi somente então que decidimos abandonar a cidade; uma multidão seguia consternada e, em meio ao pavor, identificava-se uma espécie de sabedoria – todos preferiam a decisão alheia à sua própria; uma imensa coluna empurrava e apressava os que partiam. Uma vez ultrapassada a zona construída, detemo-nos e aí experimentamos muitos sobressaltos. Na verdade, as viaturas que havíamos levado conosco, apesar de o terreno ser perfeitamente plano, eram puxadas para o sentido oposto e, mesmo escoradas por pedras, não ficavam no lugar. Além do mais, víamos o mar se afastar como se fosse repelido pelos abalos. Em todo caso, a praia havia aumentado de tamanho e, sobre a areia ressequida, viam-se muitos animais marinhos. Do outro lado, uma nuvem vermelha e assustadora, rasgada por rápidos e cintilantes ziguezagues de uma língua de fogo, entreabriu-se formando longas chamas, semelhantes a relâmpagos, porém maiores.
Foi então que o mesmo amigo de Espanha fez-se mais enérgico e mais insistente. ‘Se vosso tio está vivo – disse ele – ele quer que sejais salvos; se ele pereceu, ele quis que vós lhe sobrevivêsseis. Por que então tardam a fugir?’ Repondemos-lhe que não podíamos nos preocupar com nossa salvação quando nada sabíamos sobre a dele. Sem mais tardar, deixou-nos e, correndo desenfreadamente, escapou ao perigo. Pouco depois, a nuvem desceu sobre a terra e cobriu o mar: envolveu Capri e tirou-a da visão, ocultando agora o promontório de Miseno. Foi então a vez de minha mãe rogar-me, exortar-me, ordenar-me a fugir por todos os meios; isto me era possível, a mim que era jovem. Quanto a ela, alquebrada pela idade e pela obesidade, morreria contente, se não fosse a causa da minha morte. Eu então lhe respondi que só me salvaria junto com ela. Peguei-lhe então a mão e obriguei-a a apertar os passos. Ela obedeceu a contragosto e acusou-se de me retardar.”
Gemidos de mulheres, gritos dos homens
“Neste momento, precipitação de cinzas, porém espalhadas. Viro-me: uma névoa negra e grossa ameaçava-nos por trás e seguia-nos, como uma torrente que se espalha sobre o solo. ‘Tomemos um atalho, enquanto podemos enxergar’ – disse eu, com receio de sermos jogados ao chão na estrada e de sermos esmagados nas trevas pela multidão dos que fugiam conosco. Mal nos sentamos, eis que cai a noite, não uma noite nublada e sem lua, mas uma noite que se passa num lugar fechado, com todas as luzes apagadas. Ouviam-se os gemidos das mulheres, o choro dos bebês, os gritos dos homens; alguns chamavam o pai ou a mãe pelos nomes, tentando localizá-los, outras chamavam pelos esposos, outros pelos filhos. Alguns lamentavam a própria adversidade, outros lamentavam a desgraça dos que lhes eram próximos; havia gente que, temendo a morte, invocava a morte, muitos estendiam os braços para os deuses, mas mais de uma pessoa explicou que em nenhuma parte havia mais deuses, que aquela noite eterna era a última do mundo.
Não faltava quem aumentasse os perigos reais mediante terrores fingidos e mentirosos. Chegavam pessoas anunciando que em Miseno tal edifício desabara, que aquele outro se incendiara: era falso, mas havia quem acreditasse.
Uma fraca claridade reapareceu. Uma claridade que nos parecia não a luz do dia, mas indício da aproximação do fogo. Pelo menos o fogo não avançava muito; novamente as trevas, novamente as cinzas abundantes e pesadas. De vez em quando levantávamo-nos para sacudi-las, senão elas nos cobririam ou mesmo nos esmagariam com seu peso. Eu poderia me vangloriar de não ter deixado escapar um gemido, uma palavra pouco corajosa em meio a tão grandes perigos, se o pensamento de que eu perecia com tudo e de que tudo perecia comigo não me tivesse trazido um consolo amargo, certamente, mas apreciável.”
Tudo estava coberto por uma espessa camada de cinzas
“Por fim o nevoeiro negro atenuou-se e desfez-se à maneira de uma fumaça ou de uma nuvem; logo depois brilhou a verdadeira luz do dia, o sol; no entanto, estava lívido como por ocasião de um eclipse. Aos olhos ainda indecisos, tudo se oferecia sob um novo aspecto, tudo coberto por uma espessa camada de cinzas, como acontece com a neve. Regressando a Miseno, restauramos nossas forças como foi possível e passamos uma noite inquieta, divididos entre a esperança e o medo. O medo era mais forte: a terra continuava a tremer e a maioria das pessoas, com o espírito transtornado por terríveis predições, fazia mofa de suas desgraças e das dos demais. Mas, nem mesmo naquele momento, embora conhecêssemos o perigo por experiência e esperássemos sua reincidência, não tivemos intenção de partir sem ter notícias de meu tio.
São estes os acontecimentos, indignos da história, que vós lereis, sem ter a intenção de escrevê-los em vossas obras; e culpareis a vós mesmos, que mos pedistes, se eles não forem dignos sequer de uma carta. Adeus!”
Como se vê, em nenhum momento Plínio, o Jovem, ou Plínio, o Velho, estiveram em Pompéia, nem puderam recolher informações de primeira mão sobre a agonia da cidade. O trajeto de Plínio, o Velho, é fácil de ser seguido: de Miseno, ele partiu com a frota de grandes navios para Herculano. Mas por volta das 16 horas a lama de lava, as praias sublevadas, impediam qualquer desembarque. Às 18 horas, ele desembarca em Stabia e, ao raiar o dia, 25 de agosto, morre asfixiado na praia mesmo de Stabia.
Quanto a Plínio, o Jovem, permanece em Miseno durante todo o dia 24 de agosto e, no dia 25 de agosto de manhã, deixa a cidade para alcançar o campo em companhia de uma multidão angustiada. Na tarde do mesmo dia ele chega a Miseno. As horas não são mais favoráveis que os lugares para permitirem que se acompanhe o filme da erupção em Pompéia e Herculano.
O verdadeiro filme da erupção
Sabe-se hoje que a erupção começou no dia 24 de agosto, por volta das 10 horas da manhã. A primeira fase, bem como a segunda, não puderam ser observadas por Plínio, o Jovem. Quando Plínio, o Velho, se aproxima do litoral vesuviano, por volta das 16 horas, Pompéia já está enterrada há várias horas, recoberta de cinzas. Herculano é uma torrente lodosa, como está dito no texto, onde as camadas de cinzas separam as valas que inundam a cidade. Segundo as informações transmitidas a Plínio, o Jovem, a erupção atingiu o ponto culminante na manhã do dia 25 de agosto, quando os abalos sísmicos destroem a vivenda de Pomponianus em Stabia e quando as cinzas e os lapili caem em grande quantidade, sufocando Plínio, o Velho. A precipitação de cinzas continua nos dias 25 e 26. Somente no dia 27 é que se volta a ver a luz do sol. Em Miseno, o vento, tendo mudado de direção e empurrando a nuvem de cinzas para o golfo, deixa a cidade coberta de cinzas brancas. Características das camadas profundas da bacia magmática no fim da terceira fase, estas cinzas brancas não são encontradas em Pompéia, mas nos materiais da última corrente de lama em Herculano.
Limitada assim no espaço e no tempo, a experiência vivida pelo tio e pelo sobrinho, dramática como possa parecer, rica em detalhes que nos possam ter chegado, não satisfaz a curiosidade, deixando-nos longe de assistir ao mecanismo real da erupção inicial. Abandonemos estas páginas, relatando um fato de dimensão e importância excepcionais. Pela análise dos materiais expelidos pelo vulcão, materiais sob os quais o arqueólogo conseguiu ressuscitar a cidade enterrada, retracemos, com A.Rittmann e Robert Etienne, o desenrolar da erupção.
A natureza particular do vulcão
O Vesúvio não é um vulcão simples. Sendo claramente um vulcão de estratificação inversa, no Vesúvio a sucessão de fenômenos eruptivos é inversa à que encontramos num vulcão composto de estratificação normal. Enquanto este último começa lançando um magma menos viscoso e mais básico, até ficar ácido, o Vesúvio apresenta estes fenômenos na ordem inversa, quando se analisam as rochas vulcânicas dos cones superiores superpostos, a Somma primitiva, a Somma antiga e a Somma recente.
E o Vesúvio apresenta outra diferença. Num vulcão em período de atividade constante e de conduto aberto, todos os produtos, lava, escórias ou cinzas, apresentam uma composição química constante. Ora, há milênios que o Vesúvio estava em repouso. Pompéia não havia sido construída sobre uma corrente de lava pré-histórica? Depois desta erupção, nunca registrada na memória dos homens, o vulcão conheceu um longo intervalo de absoluta inatividade externa, durante a qual o conduto vulcânico permanecera hermeticamente obstruído por uma rolha de lava consolidada.
O magma de um vulcão assim inativo, no conduto e na bacia, é calmo, isto é, não está em permanente estado de ebulição provocada pelos gases emitidos quando de uma atividade persistente. Pode, portanto diferenciar-se: os gases sobem lentamente para o alto e se acumulam, enquanto que os cristais pesados descem para a massa em fusão e se acumulam nas partes profundas do conduto e da bacia.
Se, após tal diferenciação, a rolha do conduto cede às pressões dos gases magmáticos, dá-se então a erupção inicial, durante a qual são lançados, com enorme força explosiva, primeiro os pedaços da rolha e, imediatamente após, os fragmentos do magma muito rico em gases e contendo poucos minerais pesados, que no ar transformam-se em pedras-pomes porosas. Vêm em seguida os fragmentos do magma pesado e, finalmente, as cinzas constituídas pelo magma pulverizado, ainda mais pesado, e pelos blocos de lapili e os pós arrancados das paredes do conduto.
Semelhante erupção abala o vulcão em seus fundamentos e provocam numerosas fraturas que facilitam a formação de uma nova cratera quando as paredes centrais do edifício vulcânico desabam. Ao final da erupção, um fluxo de lava facilmente escoa ao longo das fraturas que comunicam diretamente com a bacia interna. O magma, que é então expelido, é pobre em gases e um tanto viscoso. Ele forma uma corrente de lava que encerra em si materiais diferenciados, eventualmente enriquecidos de materiais pesados.
Os materiais vulcânicos
Tudo isso se verifica quando se estuda a estratigrafia dos materiais vulcânicos na Grande Palestra, o segundo maior estádio de Pompéia, na periferia sudeste da cidade; fora das construções, temos certeza de que podemos “fotografar” a sucessão cronológica dos materiais vulcânicos. Inicialmente, a 2,60m de altura, encontra-se um depósito de pedras-pomes que se acumularam num período de tempo muito curto, mas cuja evolução é possível seguir: logo no início, numa espessura de cinco centímetros, pedras-pomes muito porosas e numerosos lapili que representam fragmentos da rolha de lava que obstruía o conduto antes da erupção, outros fragmentos de lava provindo das paredes do conduto; em seguida, as pedras-pomes esbranquiçadas, depois mais acinzentadas e pesadas.
A 2,50m de altura, as pedras-pomes apresentam coloração cinza esverdeada. Esta variação da natureza das pedras-pomes prova que, antes da erupção, o magma era fortemente diferenciado no interior do conduto. Pela presença de pedras arrancadas das paredes do conduto e da bacia magmática, é possível saber-se que, a 1,20m de altura, os elementos depositados são provenientes de uma profundidade de um quilômetro; a 2,50m, de cinco a seis quilômetros. A 2,60m, encontramos uma camada de areia vulcânica endurecida, em seguida lapili, depois cinzas misturadas com lenha calcinada, estratos de lapili encerrando uma camada de cinzas e, por fim, 30 centímetros de cinzas pisolíticas, as cinzas granuladas.
A verdadeira história da erupção
Conhecidos estes elementos científicos, torna-se fácil agora reconstituir as fases da erupção e descrever tudo que se passou em Pompéia a partir de 24 de agosto de 79.
O Vesúvio despertou brutalmente sem que nenhum sinal, nos dias precedentes, tivesse permitido aos pompeanos acompanharem o progresso de uma atividade crescente, o que teria permitido, talvez, evitar perdas humanas. Os abalos do solo faziam-nos temer no máximo um terremoto.
A erupção teve início com um pavoroso estrondo; a rolha de lava saltou, os pedaços mais pesados caindo perto da cratera. Mal se abriu, o conduto deixou fundir, em violenta explosão, o magma muito rico em gases de alta pressão. Desse modo foram projetados no ar a vários milhares de metros de altura, fragmentos de lava que liberavam seus gases para se transformarem em pedras-pomes muito porosas. A velocidade diminuía com a altura e simultaneamente os fragmentos inchavam, ao emitir grande quantidade de gases quentes. A coluna de emissão gasosa aumentava rapidamente em altura por força da expansão dos gases. Uma vez diminuída a força de lançamento, as pedras-pomes caíram em grande número em volta do monte, principalmente sobre as regiões meridional e oriental. Elas enterravam Pompéia tanto mais depressa porque o vento empurrava as cinzas para o mesmo sudeste onde estava situada a cidade de Stabia (hoje o porto de Castellamare).
Passada esta fase, caracterizada pela ejeção das pedras-pomes que esvaziaram todo o conduto, os gases só arrastaram uma pequena quantidade de magma, ao mesmo tempo em que a poeira das rochas arrancadas das paredes do conduto, e provocavam de vez em quando uma chuva de cinzas arenosas. No momento em que a emissão gasosa diminuía de intensidade, as paredes da parte superior do conduto desmoronavam, criando um obstáculo temporário à emissão de gases; em seguida, a pressão dos gases levava a melhor e projetava aos ares os detritos, provocando a intervalos as chuvas de lapili; aí então a chuva de cinzas voltava a aumentar de intensidade.
A fase culminante: formidáveis explosões
Por outro lado, o esvaziamento do conduto havia produzido uma baixa de pressão hidrostática sobre o magma da bacia. O magma profundo estava supersaturado de gases e começava a espumar, subindo pelo conduto e liberando, em formidáveis explosões, o excesso de gases. Disso resultavam outras erupções de cinzas pulverulentas, constituídas em grande parte pelos produtos vidrosos do magma. Foi aí que se deu a fase culminante da erupção: uma grande parte da Campânia estava coberta de nuvens densas de pós, carregados de gases, onde predominavam vapor de água e ácido clorídrico. Em virtude da viscosidade do magma, a atividade explosiva não é uniforme, apresentando ondas baixas e altas. Tremores e fendas seguiam-se às explosões. Além disso, grandes quantidades de vapor de água, expelidos ao mesmo tempo em que as cinzas, condensam-se e, ao contato, com estas gotas, a cinza se solidifica e forma no ar os pisólitos que encontramos na camada superior das cinzas de Pompéia.
Pouco a pouco diminui a força explosiva, à medida que o magma vai perdendo seus gases. E, com a única emissão de vapor de água não acompanhada de cinzas, a erupção entra em sua fase final. Aí então é que o teto rochoso, tendo perdido o arrimo, cede ao próprio peso, que as fraturas deixam passar o magma e que as correntes de lava invadem as regiões afastadas do vulcão, como Catello di Cisterna. Mas já não havia pompeanos para perceber o fato: era o dia 26 de agosto ou a noite seguinte.
O historiador grego Díon Cássio registrou a explosão da rolha do vulcão, ao falar de pedras de massa extraordinária que foram levantadas até o cimo do monte e da chuva de cinzas que constitui o essencial, a bem da verdade, das observações de Plínio, o Jovem. O drama humano de Pompéia pode ser imaginado pelo que conta Plínio, o Jovem, sobre o fim de seu tio. Mas são os próprios mortos de Pompéia, por seu número, por sua atitude, que nos fazem literalmente assistir aos últimos momentos de sua agonia.
Exatamente como a morte os surpreendeu
Se nenhum habitante de Pompéia sobreviveu para contar a atroz catástrofe, sua história está tragicamente inscrita na lava. Ao cair do alto, esta se solidificava e como que petrificava os corpos que aprisionava. Foi o arqueólogo italiano Giuseppe Fiorelli, em fevereiro de 1863, quem primeiro teve a engenhosa idéia de moldar as gravuras nas cavidades deixadas pelos corpos dos pompeanos. As cinzas úmidas grudavam-se compactamente ao cadáver, penetrando em todas as cavidades do rosto, nas pregas das vestimentas. Solidificando-se em volta do corpo, conservavam a impressão deixada por este e aprisionava o esqueleto. Bastava verter na cavidade gesso líquido para que reaparecessem fielmente os traços, os gestos, a última atitude dos pompeanos, que hoje tanto nos comovem.
Encontram-se nas ruínas de Pompéia mais de dois mil cadáveres de homens, de mulheres e de crianças que não conseguiram deixar a cidade e que foram esmagados sob os escombros das casas ou sob a lava solidificada. Um décimo da população! Ignora-se o número dos que pereceram nos campos, nas estradas e nos navios que tentavam alcançar o largo e que foram relançados na fornalha pela imensa ressaca produzida pelas marés.
Não foi somente em Pompéia que houve tantas vítimas, mas também em todas as cidades da Campânia ao alcance da lama ardente, da lava e das pedras incandescentes. Herculano, por exemplo, a oeste do Vesúvio, no golfo. Outras cidades, no entanto, foram tão completamente arrasadas que nem mesmo sabemos onde eram localizadas. Somente seus nomes sobreviveram à catástrofe do mês de agosto de 79: Taurânia, Leucopetra...
Inúmeras cidades foram destruídas pelas invasões ou pelos incêndios. Nestes casos, tudo que elas continham foi dizimado. Em Pompéia, a erupção do Vesúvio foi tão súbita, tão imprevista, que o único pensamento de seus habitantes foi escapar à morte. Os que se atrasaram para juntar e levar os objetos aos quais se apegavam pagaram com a vida. Tudo se passou, portanto, como se a vida tivesse bruscamente parado por volta do meio-dia do 24 de agosto de 79. Foi tarefa dos arqueólogos encontrar e preservar as impressões que hoje surpreendem o visitante.
Na vila do amante de música
Em poucos instantes a vila do amante de música Lucius Herennius Florus, construída sobre o flanco do Vesúvio, frente à Pompéia, foi arrasada. O tremor de terra de 63 já a havia seriamente danificado, destruindo seu peristilo de 20 colunas coríntias. Precisamente nesta ocasião realizavam-se trabalhos de restauração. Somente os quartos dos criados, a adega e o lagar estavam habitados.
Naquele dia, 24 de agosto de 79, as cubas estavam vazias e o vinho do ano anterior, vendido ou selado nas ânforas. O proprietário permanecia no local para supervisionar os trabalhos de restauração nos quartos e nos banheiros. A chuva de cinzas e pedras provocou o pânico. Sob o efeito dos abalos, a casa oscilava nas bases. O proprietário, um intendente e um escravo tentaram fugir, mas na escuridão, intoxicados pelos vapores de enxofre, foram obrigados a recuar para procurar um abrigo seguro. Na pressa, reúnem-se os tesouros da casa, as jóias, as taças, as poncheiras de prata em relevo e mil peças de ouro, todas novas, que um escravo de confiança se encarregara de esconder no subsolo da vivenda. Em busca de um esconderijo apropriado, ele chegou à adega. Os gases venenosos chegaram antes dele. O infeliz caiu por terra e morreu no meio das riquezas que havia transportado. Sua ama e seus dois companheiros, que protegiam o rosto com lençóis, conheceram o mesmo destino no pátio do lagar.
O flagelo continuava a se ampliar. Mais longe do Vesúvio do que Herculano, Pompéia já sofria a chuva de pedras e cinzas. Como escapar? Os que dispunham de um cavalo ou de uma carroça apressavam-se a deixar Pompéia. Outros, em maior número, refugiavam-se nas adegas, sob as abóbadas, nos redutos, esperando o fim do pesadelo. Morreram asfixiados pelos vapores deletérios espalhados pelos ventos. Alguns apanharam dinheiro e objetos de valor, cobriram a cabeça com mantos, com uma almofada ou com um lençol e debandaram. Tochas e lanternas a óleo iluminavam fracamente a cena. Enquanto os fugitivos abriam caminho através da camada de lapili, numerosos pompeanos continuavam morrendo asfixiados nas ruas, vítimas dos gases sulfurosos. A cinza úmida grudava-se às pernas e os que não conseguiram fugir a tempo tiveram um fim horrível. As cenas de pavor foram sem conta: homem ou animal, ninguém foi poupado.
O pão ainda está no forno
A catástrofe foi tão inesperada que em toda parte encontram-se os preparativos para as refeições abandonados. Aqui um leitão cozinhando na panela de bronze. Ali, na casa do padeiro, o pão ainda está no forno. Os habitantes dedicavam-se à sua habitual ocupação nas casas, nos campos e nos canteiros de obras. De repente, a vida parou. Ferramentas e utensílios foram abandonados. A mão do destino acabava de se abater sobre a cidade. Os animais também foram tomados de pânico. Puxando os cabrestos, alguns conseguiram livrar-se, mas a maior parte morreu nos estábulos. De todos, foram os cães de guarda, presos nas suas casinhas, que conheceram a pior sorte.
Como a chuva de cinzas provinha do Vesúvio, portanto do interior da terra e do norte, os fugitivos primeiro se dirigiram para o oeste, na direção do mar, depois para o sul. Tomaram as ruas que conduziam à porta de Herculano e à porta Marina: rua de Nola, rua da Fortuna e rua da Abundância, a principal artéria comercial. Gritando, berrando, interpelando-se, os pompeanos procuravam manter contato com seus próximos; o marido ajudou a mulher, os pais ajudaram os filhos. Alguns, enlouquecidos, erravam sem destino.
Vilas, palácios luxuosos, casas modestas e tabernas ameaçavam enterrar seus ocupantes. Impiedosa, a saraivada de cinzas e de lapili incandescentes não parava de cair. Como a atmosfera das casas tornava-se irrespirável, os habitantes arriscaram-se a sair às ruas, enfrentando a chuva de cinzas na esperança de se salvarem.
Um pobre cão acorrentado
Os filhos do banqueiro Caecilius Jucundus, Quintius e Sextus, abandonaram a moradia. Passaram pela casa de Vesonius para alcançarem a rua da Fortuna. Mas Vesonius, amigo deles, já havia fugido com a família, esquecendo o cão na corrente. Através da abertura do complúvio, as escórias penetravam no átrio; na medida em que lhe era permitido pelo comprimento de sua corrente amarrada no pescoço por uma coleira de bronze, o pobre cão subia nas cinzas, procurando desesperadamente livrar-se. Finalmente, o infeliz animal caiu de costas e expirou o último suspiro.
Na rua que levava à porta de Herculano, a multidão era densa. Os habitantes dos quarteirões a oeste de Pompéia, mais próximos do mar, conseguiram salvar-se; entre eles, Caius Sallustius, ao qual pertencia a casa da esquina, no final da rua de Mercúrio. Em compensação, sua mulher perdeu tempo tentando apanhar as jóias; não longe do local, na rua, acompanhada de três outras mulheres de condição modesta, ela caiu com dinheiro, espelho e jóias, afundando na cinza molhada.
Na habitação de Pansa, ali perto, os ocupantes tomaram a precaução de proteger as obras de arte, em particular um pequeno grupo de bronze, Baco e o Sátiro, que pretendiam levar consigo. Mas, ainda no jardim, jogaram-no dentro de um vaso de cobre que ali se encontrava. Os proprietários conseguiram fugir; mas quatro mulheres, locatárias da mesma casa, refugiaram-se dentro de um cômodo, na esperança de fugir à catástrofe. Morreram junto com seus bens, asfixiadas pelos gases venenosos.
Um banquete fúnebre também para os assistentes
Na via dos Sepulcros, que ia da vila de Diomedes à porta de Herculano, no momento da erupção realizava-se um banquete fúnebre. Os assistentes estavam grupados no triclínio ornado de afrescos, especialmente construído para esta finalidade. Estendidos sobre os leitos de repouso, morreram asfixiados. Festejando o enterro de um parente, era o deles próprios que festejavam.
Bem perto dali, uma mulher com braceletes e brincos de orelha ornado de pérolas, tendo nos braços uma criança, refugiou-se num mausoléu cercado de colunas; duas jovens mulheres já se encontravam ali. O monumento desabou sobre as quatro.
Ainda na via dos Sepulcros, mas diante da porta de Herculano, reinava uma indescritível desordem. Presas de pânico, as pessoas se precipitavam para frente e os corpos se amontoavam perto dos muros. Todos aqueles que tentavam atingir o mar, naquela época mais perto de Pompéia do que hoje (o acúmulo de cinzas fez recuar a praia), convergiam para este ponto, acreditando encontrar a salvação. Ora, nas praias é que os abalos foram mais fortes; ondas enormes abatiam-se sobre as praias. Ante o mar enfurecido e praias cobertas de cadáveres de animais e de peixes que divisavam sob a luz dos archotes, os fugitivos apavorados voltavam à cidade para procurar abrigo. Um após o outro, os infelizes caíam sobre as cinzas. Muitos entraram para a eternidade com um saco de ouro ou de prata nos ombros.
Numa casa da rua de Stabia, aquela cuja soleira é ornamentada por um mosaico muito bonito representando um cão, tendo acima a advertência: Cave canen (cuidado com o cachorro), duas jovens perderam preciosos minutos à procura de suas jóias.
Os operários que trabalhavam na reconstrução das termas centrais também fugiram. Mais além, na casa cujo átrio era ornamentado com a estátua do fauno dançando, verdadeiro palácio que compreendia salões e grande número de quartos e um peristilo cujas 24 colunas jônicas orlavam o jardim, seus ocupantes não conseguiam decidir-se a abandonar suas riquezas. Os olhos esbugalhados pelo terror, viam os lapili penetrar pelo complúvio e ricochetear na estátua de bronze. A maioria refugiou-se na casa. Com toda a pressa, a dona da casa recolheu as jóias mais preciosas: braceletes de ouro em forma de serpente, anéis, grampos de cabelo, brincos, espelho de prata e uma bolsa cheia de ouro. Depois, apressou-se em fugir. Mas, apavorada pelas cinzas que caíam, voltou ao tablinum, o cômodo de recepção. Mal penetrara ali, o teto desabou, aprisionando a infeliz e seu tesouro. Os demais habitantes também morreram asfixiados em seus refúgios. Confundidos na adversidade, banqueiros, duúnviros, escravos e serviçais morreram ou fugiram.
Fuga desvairada no terreno de esportes
Na parte de Pompéia orientada para o leste, a situação era tão terrível como nos outros quarteirões. O anfiteatro e a Grande Palestra, que tinha uma piscina de 30 metros de comprimento, em poucos minutos se encheram de lapili, logo recobertos por uma espessa camada de cinzas. Com exceção de alguns vigias, o anfiteatro estava vazio. Nos subsolos, não havia nenhuma fera. Em compensação, havia uma multidão na palestra, terreno de esportes da juventude pompeana. Quando subitamente a saraivada de pedras começou a cair, a assistência se refugiou debaixo do pórtico. A proteção desabou. Houve muitos mortos. Foi uma fuga desvairada. Muitos conseguiram salvar-se, mas outros tiveram o mesmo destino que este homem, um serviçal de Ísis sem dúvida, que, querendo salvar dois vasos sagrados colocados sobre um altar próximo, morreu coberto sob a cama de cinzas.
Na morada de Tredius Valens, homem rico e influente, cujas paredes estavam cobertas de inscrições eleitorais, a queda do teto matou quatro pessoas que se apressavam a deixar o átrio.
Em toda parte as mesmas cenas se repetiam. Mais longe, numa casa patrícia cujo proprietário estava ausente, escravos comandados por um intendente, o liberto Quintus Poppeus Erotus, haviam permanecido para cultivar as terras do mestre situadas nas cercanias de Pompéia. A habitação era dividida em duas partes: a que era reservada ao amo e as dependências dos domésticos, no primeiro andar, alojamento de escravos e de seu vigia. Quando a chuva de pedras e cinzas começou a cair, os poucos ocupantes do andar térreo passaram diante dos afrescos que representavam Menandro, poeta cômico grego, e os bustos que enchiam a átrio, recuando para o tablinum, o mais belo cômodo da casa, entre o peristilo e o átrio. Dois anciãos e dois adultos caíram, asfixiados, perto da entrada.
Com uma lanterna de bronze
No início, os escravos, que permaneciam no primeiro andar, hesitaram em deixar seus alojamentos, mas vendo as pedras que continuavam caindo e a camada de lapili que já atingia quase dois metros e meio no átrio, optaram pela fuga. Portando uma lanterna de bronze, um deles precedia os companheiros. Os nove homens desceram os degraus de madeira que levavam ao átrio e tombaram uns sobre os outros entre a escada e a porta. Sua agonia deve ter sido atroz.
Duas mulheres que habitavam na mesma casa escolheram solução oposta. Vendo o chão coberto de vários metros de cinzas, procuraram refugiar-se no primeiro andar, sobre a estrebaria. Os tetos cederam e as enterraram. Na parte do alojamento posterior, o vigia recusou-se a deixar sair os escravos. Ele próprio, dominado pela asfixia, refugiou-se com a filha menor dentro do seu aposento. Deitou-se na cama e cobriu-se de almofadas e travesseiros. Também ali os gases venenosos consumaram sua obra. Suas mãos crispadas de agonia deixaram escapar sua fortuna: uma bolsa de couro presa a uma corrente de prata, contendo um pouco de ouro, e peças de moeda. Servidor fiel, sucumbiu no cômodo onde guardava o selo do mestre e as ferramentas dos trabalhadores que sua função ordenava não abandonar.
Um vizinho, Publius Cornelius Tegetus, enriquecido no comércio, achou de salvar objetos de arte que tinha dentro de casa. Na esperança de que a chuva de lapili cessasse, mandou seus escravos apanhar no jardim uma estátua de bronze dourado que representava um efebo. No átrio, cobriu-se a estátua com lençóis e depois, como o cataclismo não se acalmava, Cornelius Tegetus abandonou os bens e fugiu na direção do sul com seus companheiros.
Os ocupantes de uma pequena casa vizinha, a do sacerdote Amandus, foram menos favorecidos pela sorte. Uma parte dos cômodos estava alugada a um fabricante de prateleiras de cera, as escrivaninhas da época. Também aí, acreditando-se estar protegido pelo teto, hesitou-se a correr os riscos de uma fuga apressada. Os nove membros da família de Amandus caíram ao solo asfixiados no vestíbulo antes mesmo de chegarem à rua entulhada de escórias e de lapili.
A bela jovem apertando o espelho
Na casa dos Mistérios, há pouco tempo transformada em exploração agrícola, a chuva de cinzas surpreendeu três mulheres no primeiro andar da casa. O teto e o assoalho desabaram, precipitando-as no andar inferior; com os membros quebrados, morreram asfixiadas pelas emanações sulfurosas. Uma delas, uma bela jovem, apertava contra o peito um pequeno espelho de bronze. Os trabalhadores, ocupados com o trabalho de restauração, refugiaram-se no subsolo e aí morreram. No momento em que, sentindo a asfixia, quiseram fugir, a única porta de saída tinha desabado. Uma jovem mulher conseguira abrir caminho até a entrada da vila, mas caiu por terra, vencida pela fadiga e pelos gases. Um homem, sem dúvida o porteiro, errara de quarto em quarto antes de decidir-se por um reduto exíguo hermeticamente fechado. A morte o surpreendeu ali; sua mão ainda segura um anel de ferro ornado por uma cornalina representando uma silhueta feminina. A vivenda estava semivazia: uma parte dos ocupantes conseguira fugir. Foram encontrados apenas oito cadáveres.
Na habitação de Paquius Proculus, sete crianças brincavam numa sala. Ao desabar, o primeiro andar os enterrou sob a caliça.
Nas proximidades erguia-se uma construção por sobre uma vasta adega, três lados da qual bordejavam um jardim. A abóbada pareceu constituir-se num abrigo seguro para seus moradores, que ali se refugiaram. Mas quando, semi-asfixiados, pretenderam sair para o jardim, com a cabeça coberta de lençóis, afundaram nas cinzas. Uma jovem que procurara ajuda e proteção junto da mãe agarrou-se a ela em seu desespero.
Não longe do local, numa lavanderia, proprietários e clientes, surpreendidos pela erupção, encontraram a morte. Foi na rua e perto das antigas termas vizinhas ao foro, objetivo dos fugitivos, que as vítimas foram mais numerosas. Entre elas, os fugitivos de última hora, os enfermos e os inválidos; uma mulher grávida pertencente à alta sociedade perdeu sem dúvida um precioso tempo recolhendo jóias, a prataria e 100 moedas, e ainda, antes de partir, fechou a casa à chave. Este atraso lhe foi fatal. Ela pereceu nas cinzas liquefeitas, ao pé das escadas que conduziam à rua.
Atrás de seu cadáver, foi encontrado outro de uma mulher e de uma jovem de 14 anos. A mulher, sem dúvida de origem patrícia, era esbelta e elegante, devendo ter possuído seios maravilhosos. Dois belos anéis de prata enfeitavam um de seus dedos. Perto dela foram encontrados três pares de brincos, uma centena de moedas de prata e dois vasos de ferro. Antes de expirar o último suspiro, a moçoila posou sobre o braço a cabeça coberta com o manto que usava. Mais além, um gigante, verdadeiro atleta que acompanhava as mulheres para protegê-las, estava caído de costas, sem vida, incapaz de prestar auxílio às armas. Tinha num dos dedos um anel de ferro e usava sandálias, em parte conservadas.
63 mortos no quartel dos gladiadores
No momento da erupção, os teatros estavam vazios; em compensação, ao sul da cidade, nos pórticos e nas construções que serviam de quartéis aos gladiadores, a multidão era compacta. Ninguém compreendia da situação quando, subitamente, irrompeu um salve-se-quem-puder generalizado. As colunas e as paredes, cobertas de grafitos que louvavam os atos heróicos e a bravura dos combatentes na arena, foram testemunhas de uma multidão em debandada. Os gladiadores foram esquecidos em suas celas, onde eram mantidos agrilhoados aos pés. Morreram de maneira trágica. De qualquer maneira, já era tarde demais, e a sorte dos outros ocupantes da caserna que haviam deixado suas câmaras – cerca de 72, à razão de dois ocupantes em cada uma – já estava selada. As cinzas bloqueavam as portas e lhes impedia a passagem. Tomados de pânico, eles se reuniram em várias dependências. Numa delas, foram encontradas 34 impressões de cadáveres. Em outra, que servia de depósito de armas e de capacetes para os gladiadores, 18 cadáveres, entre os quais um de mulher, uma patrícia vestida com véu bordado a ouro e jóias fascinantes, em particular um bracelete de ouro usado no tornozelo e uma corrente de ouro na cintura. Sem dúvida uma grande dama que fora visitar em seu cômodo um dos heróis da arena. Somente neste local, 63 pessoas encontraram a morte, bem como vários escravos que estavam carregando um cavalo com objetos de valor, tecidos e vestimentas.
Perto da caserna, transformada em túmulo, uma casa marginal à rua Stabia possuía um postigo de ferro que permitia acionar o complúvio, uma abertura no teto do átrio para onde convergia a água da chuva; os 12 moradores fecharam o postigo de ferro. Inútil precaução: todos morreram por asfixia.
Os sacerdotes de Ísis faziam sua refeição
Da mesma forma que os ocupantes das habitações particulares, os pompeanos que se encontravam nos templos e nos edifícios públicos foram surpreendidos pela catástrofe. Os sacerdotes de Ísis, reunidos no triclínio em volta de uma mesa guarnecida de pão, aves e peixes, faziam sua refeição. Sua primeira atitude foi a de oferecer um sacrifício à deusa. Depois, como o santuário ameaçava ruir, confiaram a um deles o tesouro do templo. Num saco de linho, enfiaram uma grande soma em moedas novinhas com a imagem do imperador reinante, Tito, estatuetas de Ísis, taças utilizadas nas cerimônias de sacrifício e outros objetos de culto. Mas já era tarde demais. Com sua pesada carga, o sacerdote designado dirigiu-se para o foro mas, chegando à esquina da rua da Abundância, incapacitado de prosseguir através das pedras, caiu ao chão, deixando escapar o conteúdo do precioso saco.
Dois de seus colegas tentaram fugir pelo foro triangular que se comunicava com o templo de Ísis. No momento em que ali chegavam, um abalo derrubou uma parte da colunata, que esmagou os infelizes. Próximo aos cadáveres, foi encontrada uma salva de prata com a efígie de Ísis e Baco e numerosos objetos de grande valor. Seus colegas, que haviam preferido esperar um abrandamento do fenômeno, tiveram o mesmo destino dos que procuraram refúgio nos subsolos e nos redutos. Alguns tombaram numa escada, atrás da cozinha; um outro morreu emparedado vivo: armado com um machado, este último tentou abrir caminho; já havia perfurado duas paredes quando, diante da terceira e última, asfixiado, caiu morto.
Dois meninos com mãos entrelaçadas
No centro deste horror, ainda hoje intensamente presente, quando visitamos as ruínas da cidade e o museu de Nápoles (onde estão expostos os moldes dos cadáveres encontrados nas cinzas), desenrolaram-se cenas pungentes.
Perto da porta de Nocera, três famílias se reuniram sob o mesmo teto para se abrigarem dos lapili e posteriormente das cinzas, misturadas a uma chuva torrencial. Elas tentaram então uma saída. Um escravo que caminhava à frente carregava nos ombros um saco cheio provavelmente de provisões para uma jornada. Caiu sob a ação, ao mesmo tempo, do fardo e da força do vento contra o qual lutava. Mais atrás, dois meninos de mãos dadas seguravam ou uma telha ou um pedaço de ferro como proteção. Um casal os seguia com uma menina. A mulher caiu de joelhos, apertando contra a boca um pedaço de pano, na tentativa de se proteger contra os vapores mortais. O velho que ia atrás de todos caiu ao chão e tentou desesperadamente levantar-se, apoiando-se nos braços a fim de prestar socorro aos seus ou para olhá-los pela última vez.
Em três horas, das 10 da manhã à uma da tarde, a morte completou sua obra em Pompéia.
Em Herculano, aconteceu a mesma coisa, mas de maneira um pouco mais lenta: entre 13 horas e 18 horas.
Torrente de lama, com uma altura de 15 metros, sobre Herculano
Das 10 às 13 horas, os blocos de terra amontoavam-se sobre os lábios da cratera explosiva. Ensopados pela chuva, misturados às pedras-pomes e às cinzas, logo formaram uma massa lodaçenta que deslizou rumo ao mar. A abertura ocorreu deste lado, na parte oeste; foi também aí que a parede da cratera cedeu. Cobrindo casas e vivendas dispersas nos flancos do Vesúvio, a torrente desceu sobre a pequena cidade portuária de Herculano, inundando seus templos, seus monumentos, suas fontes e seus altares. Ao encontrar o obstáculo das muralhas, a lama hesitou e, depois, derrubando o empecilho, despejou-se em diversos braços, ao longo das ruas, enchendo as ruelas e vielas. Caudais de lama desciam sem interrupção. Com uma altura de 15 metros, a torrente a tudo submergia, cobrindo casas e santuários, engolfando os menores recônditos. Precipitou-se no subsolo do teatro, após ter derrubado as paredes e as estátuas. Sob o ímpeto do caudal, as estátuas de mármores caíram dos pedestais. Uma quadriga de bronze, que encimava um edifício público, partiu-se e o fluxo de lama arrastou-a, dispersando milhares de fragmentos.
Imediatamente, os habitantes de Herculano compreenderam a extensão da catástrofe que se havia abatido sobre eles. Ante os abalos sísmicos constantes, o rio lama que avançava inexoravelmente, a chuva de lapili, a fuga era a única solução.
Os que possuíam um cavalo ou uma carroça fizeram-se ao largo, sob a luz incerta dos archotes, na direção do mar ou de Nápoles. Os outros partiam a pé, levando na mão uma lamparina a óleo. Apena alguns, doentes, velhos, inválidos ou prisioneiros dos escombros, pereceram sob as cinzas. Mas estes foram as exceções, pois, em Herculano, todos só tinham um pensamento: a fuga. Ninguém pensou, como aconteceu em Pompéia, em se refugiar nos subsolos ou sob as abóbadas. De qualquer maneira, a lama viscosa que penetrava pelos telhados os teria impedido. Graças a esta fuga geral, a maior parte da população foi salva.
Fuga desesperada
Todavia, grande número de carroças, cheias de fugitivos que protegiam a cabeça com almofadas e lençóis, saiu dentro da escuridão; algumas não conseguiram achar o caminho; outras viram-se detidas por rachaduras intransponíveis; tudo isto sob uma atmosfera viciada pelos vapores do enxofre. A fuga foi desesperada. A massa de lama líquida continuava avançando; chegando à praia, avançou 200 metros mar adentro. Já não restavam vestígios de Herculano. O grande templo de Cibele, reconstruído com grandes gastos por Vespasiano, a vila da gens Pisônia, sua incomparável coleção de estátuas de bronze, a biblioteca do filósofo Filodemo, o foro, os monumentos públicos, a basílica, onde estátuas eqüestres e bronzes imortalizavam os membros da família Balbia, tudo já não existia. Os habitantes fugiam, enlouquecidos de terror, na direção de Nápoles e adjacências; também lá os tremores e as chuvas de cinzas provocaram graves danos. A erupção do Vesúvio continuava; gêiseres de pedras, iluminados pela lava em fusão, surgiam da cratera sem interrupção. Um gigantesco cogumelo de fumaça negra, cortado por lívidos relâmpagos, pairava sobre o cimo do monte. A “noite” continuava densa. Em sua carta a Tácito, Plínio, o Jovem, a compara à “escuridão que reina num subsolo”. A velha cidade florescente de Herculano não era mais do que um túmulo enterrado debaixo de 15 metros de lama em processo de solidificação.
Quando, no dia 27 de agosto, o vento conseguiu por fim desfazer o espesso véu que encobria o sol, a erupção estava terminada. Um silêncio mortal reinava em volta do monstro aplacado. Tão longe quanto a vista podia alcançar, o espetáculo era horrível, aterrorizador, alucinante. A sorridente e verdejante Campânia do golfo de Nápoles não passava de uma vastidão de cor cinza e fumegante, de onde a vida tinha desaparecido.
Longe daquele inferno, milhares de fugitivos, vindos de várias cidades mártires e que haviam conseguido escapar à asfixia, vagavam, muitos e muitos dias mais tarde, melancolicamente pelas estradas e pelos campos, ainda aterrorizados, perplexos, relatando a catástrofe.
A visita de Tito e o esquecimento
O Imperador Tito, cujo reino curtíssimo seria marcado por desastres, dirigiu-se à Campânia e mandou distribuir ajuda aos sobreviventes. Mas nem ele nem seu irmão e sucessor, Domiciano, pensaram em fazer renascer das cinzas Herculano e Pompéia. Teria sido por causa de alguma terrível epidemia de peste, como não se viu igual desde a erupção do Vesúvio?
Ano após ano, século após século, o húmus veio juntar-se às cinzas, às escórias, aos detritos, submergindo até, desta vez por meio pacíficos, o topo de alguns monumentos de foro que ainda apareciam aqui e acolá.
Apesar de Plínio, de Tácito, a memória das cidades vitimadas pelo Vesúvio desapareceu.
Lendas populares conservaram a tradição de magníficas cidades, golpeadas pelo fogo do céu como a Sodoma e Gomorra da Bíblia. Mas não se sabia mais do que isso. No local onde outrora se estendia, por exemplo, a bela e feliz Pompéia, repousava no fundo da terra algo cujo nome ninguém mais sabia. Quando se falava no assunto, referia-se à Cività, à cidade. E era tudo.
Um silêncio de 16 séculos irá pesar sobre a gigantesca catástrofe.
Esta postagem é um misto de um texto e imagens de uma apresentação Power Point.
O texto é o primeiro capítulo do livro Herculano e Pompéia, de André Bellechasse, parte integrante da coleção GRANDES CIVILIZAÇÕES DESAPARECIDAS – EDITIONS FERNI, com impressão e acabamento do Círculo do Livro S.A. – Av. Ermano Marchetti, 283 – Lapa – São Paulo – Brasil.
A apresentação de slides é de autoria desconhecida e me foi enviada para o meu e-mail pessoal e integralmente aqui reproduzida.
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