No verão de 1805, um jovem aristocrata
venezuelano, em viagem de turismo pela Itália com seu tutor, subiu ao Monte
Sacro e contemplou, pensativo, os monumentos antigos de Roma. Naquele morro,
relembrou ele, mais de dois mil anos antes, plebeus oprimidos tinham se reunido
pela primeira vez em sua luta vitoriosa para arrancar igualdade política e
justiça econômica de uma minoria de patrícios arrogantes. Tomado pela emoção,
ele ajoelhou-se e, segurando as mãos do tutor, jurou libertar seu próprio país
da opressão do domínio espanhol. Simón Bolívar devotou o resto de sua vida a
cumprir esse juramento.
Vinte anos depois, em outubro de 1825, ele
escalou as encostas tremendas do monte Potosí e sobre seu pico desolado
desfraldou as bandeiras de Colômbia, Peru, Chile e Argentina. Não mais um
aspirante a rebelde, ele era o general Bolívar, cidadão mais famoso da América
do Sul, conhecido em todo o continente como o Libertador. Presidente da
Colômbia e ditador do Peru, inspecionava agora as montanhas da Bolívia, país batizado
em sua honra. Seu sonho se realizara. A Espanha perdera finalmente o controle
do continente sul-americano. O regime colonial dera lugar a repúblicas
independentes cujas constituições prometiam liberdade e prosperidade. “Em
quinze anos de luta terrível e contínua”, anunciou Bolívar para seus auxiliares
reunidos no alto do Potosí, ”destruímos o edifício que a tirania ergueu durante
três séculos de usurpação e violência ininterrupta”.
Os cinco anos seguintes iriam trair os
ideais e sacrifícios das campanhas de Bolívar. Uma a uma, as novas repúblicas
da América Latina cairiam na desunião e violência, enquanto os novos déspotas
do Novo Mundo tomariam o lugar do jugo imperial da Espanha. Desiludido e
desacreditado, Bolívar foi obrigado a assistir à queda do edifício que erguera
com tanto ardor. “Mudar um mundo está além dos poderes de um pobre homem”,
admitiu finalmente. Mas nunca perdeu a dimensão de suas próprias realizações.
“Meu nome já pertence à história e lá eu terei justiça”, escreveu desafiador, pouco
antes de morrer.
Na época do nascimento de Simón Bolívar,
em 1783, o imenso império americano da Espanha tinha mais de 250 anos de
existência. Desde que as sociedades indígenas foram destruídas pelos
conquistadores no início do século XVI, os espanhóis tinham tomado conta de boa
parte da América do Sul. Somente o Brasil, colônia de Portugal, estava fora da
jurisdição da Espanha.
Distante quatro semanas de viagem da
metrópole, esse vasto território era governado em nome do monarca espanhol por
quatro vice-reis que, por sua vez, delegavam a administração regional a uma
série de capitães-gerais, governadores e funcionários menores. No sudeste,
ficava o vice-reinado do Rio da Prata, compreendendo os atuais Argentina,
Paraguai, Uruguai e Bolívia.
O vice-reinado do Peru, do lado do
Pacífico, incluía o moderno Peru e a maior parte do Chile de hoje, territórios
separados e já virtualmente independentes um do outro. A Nova Granada ocupava o
norte do continente, abrangendo Venezuela, Colômbia, Equador e Panamá. Mais ao
norte, o vice-reinado de Nova Espanha compreendia a América Central, México e
quase todo o oeste dos Estados Unidos. No Caribe, Cuba, Porto Rico e Santo
Domingo - atual República Dominicana - completavam as possessões americanas da
Espanha.
Desde o início, a metrópole considerara
seu império do Novo Mundo como uma fonte de renda e de matérias-primas. Os
metais preciosos, que tinham originalmente atraído os conquistadores,
continuavam a enriquecer a corte espanhola. Em 1800, noventa por cento da prata
do mundo vinha das minas do México e da região do Alto Peru - hoje Bolívia. Mas
a agricultura constituía a maior parte das exportações da América espanhola.
Enormes propriedades, ou haciendas da
Nova Granada plantavam café, tabaco e cacau, pelos quais a Europa desenvolvera
um apetite insaciável; o açúcar das plantações do Caribe abastecia o paladar
cada vez mais adocicado do Velho Mundo; nas vastas pastagens da Argentina e
Venezuela, rebanhos de gado selvagem eram uma fonte lucrativa de couros para
exportação.
A América espanhola não era estimulada a
lucrar ela mesma com nenhuma dessas matérias-primas. Com efeito, só tinha
permissão para comerciar com a Espanha e, na Espanha, só com o porto de Cádiz.
A política da metrópole era manter suas colônias em estado de perpétua
dependência econômica, mercados cativos para suas indústrias manufatureiras.
Quando os comerciantes de Cádiz reclamaram que as vendas de vinho espanhol
estavam caindo nas colônias do norte, por exemplo, os vinhedos de Nova Granada
foram arrancados para evitar que vinhos baratos locais tomassem o lugar do
produto importado, mais caro.
Acontece que a Espanha precisava desesperadamente
da receita do Novo Mundo. Ela só conseguia manter sua posição entre as potências
europeias graças ao fluxo constante de metais preciosos e matérias-primas de
suas colônias. Com os Bourbon, que ascenderam ao trono espanhol em 1700, foram
feitos esforços para aumentar a renda mediante o aperto do controle sobre as
possessões. Novas leis subiram o imposto sobre consumo e reforçaram os
monopólios estatais de produtos como tabaco, bebidas e sal. Os poderes dos cabildos, conselhos municipais que constituíam
a única forma de representação permitida aos cidadãos das colônias, foram restringidos
e funcionários assalariados chegaram da Espanha para supervisionar os governos
provinciais. Quando as milícias locais deram sinais de que talvez se rebelassem,
designaram-se oficiais espanhóis para preencher os postos mais altos.
Enquanto aumentava o controle sobre a
burocracia colonial, o regime dos Bourbon liberalizava a economia. Durante a
segunda metade do século XVIII, diminuíram as tarifas sobre importações e
exportações e aboliram-se antigas restrições comerciais. Embora ainda
estivessem proibidos de negociar diretamente com países estrangeiros, os
mercadores da colônia ganharam o direito de comerciar com qualquer porto
espanhol, bem como com outras colônias espanholas.
Porém, as reformas chegaram tarde demais.
Essas tentativas de modernização e centralização apenas estimularam uma
exigência crescente de independência. Até mesmo a nova liberdade de comércio
foi pouca para satisfazer as colônias. Para alguns comerciantes
latino-americanos, as reformas não tinham avançado o bastante; outros
arruinaram-se com a entrada de artigos importados baratos. Tributos pesados e
burocratas espanhóis intrometidos ofendiam a quase todos. O ressentimento em relação
ao domínio europeu crescia e aumentavam paulatinamente as tensões sociais e
raciais que caracterizavam a América do Sul desde a conquista. Já estavam liberadas
as forças que mergulhariam a região na rebelião e na guerra civil.
Agudamente polarizada entre espanhóis e
americanos, entre raças e culturas, entre ricos e pobres, a sociedade da
América espanhola estava há muito tempo à beira da explosão. Em 1800, quase
dezessete milhões de habitantes viviam nas colônias espanholas; destes, apenas
três milhões eram brancos. No topo desse grupo racial mais privilegiado estavam
os peninsulares, nativos da Espanha,
que não passavam de 40 mil. O resto dos brancos eram criollos nascidos no Novo Mundo. Embora nem todos fossem ricos, os criollos estavam em muito melhor
situação que os de raça mesclada e não-brancos, que constituíam a massa da
população sul-americana. Eram os mestiços, de sangue branco e indígena, e os
mulatos, mistura em proporções variadas das raças europeia e africana.
De sua posição de superioridade, os
brancos referiam-se a todos os não-brancos livres como pardos. Dentro desse grupo, porém, havia vários graus de brancura.
Gente de pele clara de raça mista empenhava-se em estabelecer legalmente sua
cor branca. O que estava em questão era mais do que orgulho: a classificação
étnica afetava toda a vida da pessoa. Os pardos
não tinham acesso à educação e a cargos públicos; um pardo podia ser proibido de usar sombrinha, sua esposa, de usar
jóias, seda ou veludo; em algumas regiões, até mesmo os assentos nas igrejas
eram segregados.
Perto do fundo da escala social estavam os
índios e negros livres, bem como os zambos,
de sangue misto negro e indígena. Por fim, vinham os trabalhadores indígenas e
escravos africanos, cujo número variava de região para região. A maioria, de
índios, não era classificada oficialmente como escrava, mas seus valiosos serviços
em minas, fazendas e obras públicas eram garantidos por vários meios - inclusive
induzi-los a dívidas que nem uma vida inteira de trabalho poderia pagar. Desprezadas
e oprimidas, as classes escravizadas de negros e índios forneciam o alicerce
sobre o qual repousavam a riqueza e os privilégios da Espanha e de suas
colônias.
A política espoliativa da metrópole
provocou rebeliões violentas, embora espasmódicas. Nos dois primeiros séculos
de jugo colonial, as revoltas de índios e escravos eram comuns. Mas as reformas
dos Bourbon provocaram protestos ainda maiores. Em 1780, Tupac Amaru, um índio
peruano que se dizia descendente dos incas, provocou ondas de choques em toda a
América do Sul com uma revolta que exigia o fim da opressão dos impostos.
Porém, os 60 mil homens sem treinamento que responderam a seu chamado às armas
não eram páreo para os exércitos comandados por experientes oficiais europeus.
O levante foi esmagado. Feito prisioneiro,
Tupac Amaru teve primeiramente que assistir à execução de sua família; depois, foi
amarrado a quatro cavalos e esquartejado em público. Apesar dessa punição cruel
e exemplar, o espírito de rebelião continuou a se espalhar escala social acima
como uma peste. No inicio do século XIX, o contágio já tinha despertado
ressentimentos adormecidos até mesmo entre os criollos abastados. O movimento rebelde encontrava assim seus
lideres.
Em todo o continente, os criollos constituíam a aristocracia da
América do Sul. Possuíam grandes haciendas
e levavam uma vida de conforto privilegiado sustentado por escravos. Seus
filhos frequentavam escolas europeias; suas famílias moravam em capitais
elegantes - Caracas, Lima, Buenos Aires -, comparáveis aos centros provinciais
da Espanha no estilo de seus edifícios públicos e no esplendor de suas reuniões
sociais. Tudo que o dinheiro podia comprar, os criollos tinham a liberdade de usufruir. Mas era-lhes negada a
única coisa que satisfaria seu crescente senso de identidade: poder político.
Com medo da deslealdade e preocupados em recompensar seus emigrantes, a Espanha
assegurava-se de que os melhores postos administrativos, bem como as posições
mais graduadas do exército e da Igreja, fossem para os peninsulares. A arrogância desses recém-chegados enfurecia a elite criolla. O naturalista alemão Alexander
von Humboldt, que visitou a América do Sul no início do século XIX, comentou:
“O europeu mais baixo, menos educado e inculto acredita-se superior aos brancos
nascidos no Novo Mundo”.
O sopro de revolução vindo do exterior
despertou mais ainda as aspirações políticas do criollos. Não estavam eles na mesma situação de seus vizinhos
norte-americanos, antes que se libertassem do jugo britânico em 1781? Não eram
eles escravos de uma corte decadente e negligente, tal como os revolucionários
franceses de 1789? Jovens criollos
ambiciosos liam as obras de pensadores liberais europeus. Revolucionários
incipientes trocavam volumes contrabandeados de autores como Voltaire, Jean
Jacques Rousseau, Adam Smith e John Locke. Alguns pagaram caro por ousar
pensar. Antonio Nariño, um jovem brilhante de Bogotá, tentou publicar uma
versão em espanhol da Declaração dos Direitos do Homem, o credo da Revolução Francesa.
Por esse ato de “traição” ficou preso durante dez anos.
Os eventos na Europa ajudaram a acelerar
os primeiros passos hesitantes da América espanhola em direção à independência.
Em 1796, a Espanha aliou-se à França numa dispendiosa guerra contra a
Inglaterra, provocando um bloqueio naval retaliativo que efetivamente a isolou
de sua principal fonte de riqueza. Isso deixou as colônias livres para
comerciar usando navios estrangeiros, um estado de independência econômica que
jamais tinham gozado. O gosto dessa liberdade nunca seria esquecido.
Livre comércio, liberdade de expressão,
mais representação política: os gritos familiares dos movimentos revolucionários
de todo o mundo começavam a ser ouvidos no continente. A maioria dos rebeldes
novatos continuava fiel ao rei espanhol, enquanto pedia a queda de seu governo.
Uns poucos, porém, argumentavam que a Espanha jamais toleraria uma América do
Sul semi-independente e defendiam o rompimento com a metrópole. A independência
era a única solução.
Os ventos da revolução tinham começado a
soprar no Caribe muito antes que os criollos
entrassem num acordo sobre o que fazer. Em 1804, depois de anos de rebelião, a
colônia francesa de Saint-Domingue conseguira a independência, tornando-se a
República do Haiti. Liderada pelo ex-escravo Toussaint L'Ouverture, uma difícil
aliança de escravos negros e mulatos expulsou um exército mandado por ninguém
menos que Napoleão Bonaparte. Os nacionalistas hispano-americanos ficaram ao
mesmo tempo animados e consternados. O que podia ser feito no Haiti, podia ser
feito também na Venezuela ou no Peru. Mas a que custo? No Haiti, os rebeldes tinham
expulsado todos os brancos. Muitos criollos
hesitavam em se comprometer, com medo de desencadear as forças dos não-brancos
que estavam abaixo deles. Um vulcão construído por eles mesmos poderia entrar
em erupção.
Três mexicanos de classe alta exibem os trajes europeus que marcam sua ascendência espanhola. |
No entanto, os acontecimentos no sul do
continente surpreenderam até mesmo os nacionalistas mais radicais. Sempre
alerta para novos mercados, a Grã-Bretanha já via as colônias isoladas da
Espanha pelo bloqueio como um útil acréscimo a seu império comercial em
expansão. Em junho de 1806, uma força britânica do cabo da Boa Esperança entrou
no rio da Prata e ocupou Buenos Aires. Mas enquanto o vice-rei fugia e a
resistência espanhola oficial desmoronava, surgia um bolsão de resistência
entre as classes mais pobres. Em dois meses, os ingleses foram desbaratados por
um exército multirracial improvisado, liderado por criollos. A autoridade espanhola foi restaurada, mas os nativos
descobriram sua própria força e começaram a suspeitar que o monstro dominador
estava sem dentes e garras.
No mesmo mês em que os cidadãos de Buenos
Aires celebravam a vitória sobre os britânicos, um bando de seiscentos rebeldes
desembarcava na capitania-geral da Venezuela e apelava para que seus
concidadãos se levantassem contra os espanhóis. À frente desse exército
otimista estava Francisco de Miranda, um visionário carismático e fanfarrão que
passara boa parte da vida na Europa tentando obter apoio para a independência
hispano-americana. Alto, bonito e sempre impecável no trajar, Miranda era o
grande propagandista da libertação colonial. Jantara com Napoleão, que o
comparara a Dom Quixote; conquistara a afeição e, dizia-se, a cama de Catarina,
a Grande, da Rússia. Mas sua capacidade como general estava muito aquém de seu gênio
para as relações públicas. Sem contato com seu país, em particular com a elite criolla, enganou-se sobre a disposição
da Venezuela. Mesmo com o apoio informal da marinha inglesa, sua invasão foi um
fracasso embaraçoso. Miranda fugiu para Londres, onde sua casa se tornou um
centro de expatriados sul-americanos subversivos. “Nunca admitas que o
desespero ou o desânimo alguma vez dominem tua alma”, disse ele certa vez a um
co-revolucionário. Apesar do fracasso militar, seu entusiasmo contagiante
permaneceu como uma inspiração para o crescente número de criollos que viam na revolta armada a única saída para o futuro.
Foi nessa sociedade de altos ideais e
ambições reprimidas, de otimismo e inércia, que Simón Bolívar deu seus
primeiros passos. Nascido em Caracas, principal cidade da Venezuela, era o
quarto filho de uma família criolla
muito rica, que traçava sua ancestralidade hispano-americana até o século XVI.
Seu pai morreu quando tinha 3 anos, a mãe, seis anos depois. Embora criado por um
tio, a influência mais forte foi a de um tutor politicamente radical chamado
Simón Rodríguez. Com ele, Bolívar leu os livros liberais que circulavam entre
os nascentes revolucionários.
Mas foi na Europa, onde completou sua educação,
que Bolívar desenvolveu a paixão pela política. Foi lá também que se revelou outro
traço seu: o amor pela fama. Assistiu à coroação de Napoleão em 1804 e ficou
emocionado com o amor universal que a imensa multidão tinha por seu herói. Ser
assim tão reverenciado, escreveu Bolívar, parecia-lhe “o pináculo dos desejos
de um homem”.
Foi então que Bolívar começou a nutrir ideias
de desempenhar um papel no futuro de sua nação. ”Creio que seu país está pronto
para a independência”, disse-lhe Alexander von Humboldt, ao encontrá-lo pouco
depois de retornar de sua viagem à América em 1804, “mas não vejo o homem que
possa realizá-la”. No fundo da alma, Bolívar aceitou o desafio. Com seu velho
tutor Rodríguez, excursionou a pé pela Europa. Em Roma, perto do final da viagem,
fez o juramento do Monte Sacro. O curso de sua vida estava decidido.
Ao voltar para a América do Sul em 1807,
Bolívar assumiu a vida de um abastado terra tenente. Dirigiu com habilidade seu
latifúndio, mantendo as aparências de um proprietário modelo. Mas sua principal
preocupação continuava a ser a independência política da terra natal. Com
outros conspiradores, fazia reuniões - disfarçadas de encontros literários ou
de jogos - a fim de debater sobre os métodos mais adequados para atingir seus
objetivos republicanos.
Os eventos dramáticos da Europa não lhes
deram tempo para chegar a uma conclusão. Em 1808, Napoleão invadiu a península
Ibérica. Decidido a fechar os portos europeus ao comércio inglês, o imperador
impacientara-se com a ineficácia de sua aliada Espanha. Aproveitando-se da
invasão de Napoleão, o povo espanhol forçou o corrupto rei Carlos IV a abdicar
em favor de seu filho Fernando. Napoleão não queria nenhum dos dois: depôs
ambos os monarcas e, no lugar deles, para ultraje dos espanhóis, instalou seu
próprio irmão José.
Com esse nepotismo desastrado, Napoleão
ajudou os republicanos da América do Sul. De repente, a sociedade criolla uniu-se em oposição a José.
“Viva o rei Fernando!” - foi o grito que ressoou nas capitais do continente. Os
emissários franceses foram expulsos. E os funcionários espanhóis, parecendo
cada vez mais títeres de um usurpador francês, lutavam para conservar a
autoridade. Por mais de um ano, mantiveram-se no poder, mas em 1810, a
população criolla de todo o
continente, agindo com unanimidade notável, depôs seus governantes, com exceção
do Peru.
Em Caracas, o governador saiu quase
agradecido a 19 de abril de 1810, substituído por uma junta de criollos proeminentes. Mas Bolívar não
estava entre os novos líderes. Sua posição era intransigentemente republicana,
enquanto os membros moderados da junta contavam com alguma relação com o rei
Fernando. Mesmo assim, porque era um dos rebeldes mais articulados - e porque
se ofereceu para pagar sua própria passagem - foi nomeado delegado-chefe de uma
missão a Londres.
Apesar de sua eloquência, Bolívar não
conseguiu auxílio oficial, militar ou econômico, para a Venezuela. Para a
Grã-Bretanha, lutando agora ao lado da Espanha contra Napoleão, era complicado
apoiar as colônias rebeldes de sua aliada. Mas se a recepção pública foi fria,
Bolívar encontrou uma cálida acolhida na casa de Francisco de Miranda. Aos 60
anos de idade, ele ainda era a alma dos expatriados. Afetado pelo charme e
paixão patriótica do “famoso general”, como Londres o chamava, Bolívar pediu
para Miranda liderar a revolução na Venezuela. Embora o governo britânico
tentasse evitar sua saída do reino, Miranda conseguiu voltar para a terra
natal, e para o último e trágico capítulo de sua vida.
A expedição teve um início promissor. A 5
de julho de 1811, o Congresso Nacional de Caracas - uma assembleia eleita de criollos abastados que fora criada no
início daquele ano - votou, com uma dissensão, pela independência, tanto da
Espanha como da Nova Granada. Mas o país continuou dividido. Nem todas as
províncias da Venezuela reconheciam a liderança de Caracas e havia muita gente
temerosa de que um rompimento completo com Madri apenas levasse à tirania dos criollos mais privilegiados. Com efeito,
os próprios republicanos logo se dividiram, com Miranda e Bolívar detestando-se
cada vez mais.
Assediada por inimigos dentro e fora,
enfraquecida por disputas políticas e com a economia marchando para o caos, a
jovem república lutava para sobreviver quando a natureza acertou-lhe um golpe
fatal. A 26 de março de 1812, uma quinta-feira santa, fazia uma tarde
escaldante em Caracas; algumas testemunhas falaram de um silêncio opressivo. De
repente, o solo tremeu e a bela cidade - a terceira do continente - foi
reduzida a escombros. Dez mil pessoas - quase um quarto da população - morreram
no terremoto.
Os mais supersticiosos, estimulados pelo
clero, viram no desastre uma reprimenda divina pelo afastamento da Espanha.
“Misericórdia, rei Fernando!” – gritavam entre as ruínas. E de fato, o castigo
espanhol não estava muito longe. Do forte realista de Coro, a 320 quilômetros
de Caracas, partiu um exército comandado pelo capitão Domingo Monteverde em
direção à capital. Ao mesmo tempo, uma enxurrada de revoltas escravas persuadiu
os criollos indecisos de que a
Espanha oferecia mais segurança do que qualquer regime republicano.
A Primeira República da Venezuela afundava
rapidamente. A 25 de julho de 1812, Miranda fez um armistício com Monteverde,
uma trégua que era quase uma rendição. Ao mesmo tempo, tomou providências para
fugir, pegando dinheiro suficiente para sua aposentadoria. Mas, na última
noite, foi preso por Bolívar e outros oficiais e, sob a acusação de traição,
entregue às autoridades espanholas. Morreu quatro anos depois numa prisão de
Cádiz. Bolívar escapou para a ilha holandesa de Curaçao. A Primeira República
chegava a um fim inglório.
Bolívar não descansou no exílio, indo logo
para Cartagena, o principal porto de Nova Granada no Caribe que, tal como
outras cidades do vice-reinado, se declarara independente. Mas o país estava
desunido e sob ameaça constante das forças realistas. O venezuelano foi calorosamente
acolhido e logo lhe deram um comando.
Antes de iniciar nova campanha, Bolívar
redigiu o Manifesto de Cartagena, uma
análise da Primeira República da Venezuela. Nesse documento, emergiu um tema que
seria o credo de Bolívar pelo resto de sua vida. "Não foram os espanhóis,
mas nossa própria desunião que nos levou de volta à escravidão", escreveu
ele. “Um governo central forte poderia ter mudado tudo". A própria
estrutura da sociedade sul-americana militava contra a democracia, sustentava
ele. Um povo que desconhecia o governo representativo só poderia alcançar
liberdade e felicidade sob um “poder terríveI" que varresse os espanhóis
do país. Tratava-se de uma concepção de ditadura cheia de consequências.
Bolívar lançou-se então contra os espanhóis
com uma energia que surpreendeu tanto os inimigos quanto seus aliados,
avançando até os Andes, na direção de Caracas. A conquista dessa cidade,
argumentava, era essencial para a segurança de Nova Granada. O alto comando de
Cartagena autorizou o ataque.
O conflito feroz que se seguiu levou
Bolívar dos Andes até Caracas em três meses. À medida que avançou, seu exército
aumentou de setecentos para 2 500 homens, pois os pobres da Venezuela rural
tinham aprendido que a crueldade da contra-revolução espanhola era maior que a
da Primeira República.
Ambos os lados usaram de extremo barbarismo,
competindo em atrocidades e terrorismo. Dizia-se que um general espanhol
estimulava seus soldados a decorar seus chapéus com orelhas de simpatizantes
republicanos (mantendo um baú cheio desses souvenirs).
De sua parte, Bolívar declarou guerra de morte contra qualquer espanhol que não
aderisse à causa republicana. “Nossa vingança deve ser igual à crueldade dos
espanhóis”, anunciou ele. Essa política de destruição mútua transformaria a
Venezuela num deserto.
No momento, porém, o triunfo era de
Bolívar. A 7 de agosto de 1813, ele entrou em Caracas. Meninas vestidas de
branco levaram seu cavalo pelas ruas. “Viva nosso libertador!” - gritava a
multidão. Dois meses depois, Bolívar escolheu oficialmente esse título. Ficaria
conhecido para sempre como o Libertador.
Decidido a evitar que a Segunda República
tivesse o mesmo destino da primeira, Bolívar aceitou também o papel de ditador.
“Nossa administração deve reduzir-se ao denominador mais simples”, explicou.
Mas desde o início o país defrontou-se com problemas graves. A economia estava
em pedaços, as grandes propriedades, despovoadas, e as cidades, arruinadas.
Além disso, as facções republicanas logo estariam lutando entre si.
Nas províncias orientais da Venezuela, um
movimento nacionalista independente tinha expulsado por fim Monteverde do país.
Santiago Mariño, o jovem líder rebelde, não era homem de dividir o poder.
Proclamando-se ditador do Oriente, colocou-se em oposição a Bolívar. Sua recusa
em colaborar com Caracas contribuiu para a tragédia que se seguiu.
Ocorre que surgira um novo e terrível
inimigo mais ao sul. José Tomás Boves era um aventureiro espanhol que passara
alguns anos exilado nos llanos do
centro da Venezuela, planícies onde o capim crescia da altura de um homem e o
gado era selvagem. Ali só viviam os llaneros,
vaqueiros mestiços e semi-selvagens que não se interessavam por política, mas
que aproveitaram a oportunidade de saquear oferecida pela causa realista. Armada
apenas com facas, lanças e laços, a cavalaria de Boves abriu uma trilha de
saques, incêndios e estupros pelas vilas e cidades republicanas. O próprio
Boves deliciava-se com a crueldade, mandando desmembrar crianças e fazendo
homens e mulheres de pés esfolados caminharem sobre vidro picado.
Uma brutalidade insana tomou conta do
país, afetando monarquistas e republicanos. Na primavera de 1814, Bolívar
mandou executar oitocentos prisioneiros, por medo de rebelião. Tal crueldade
pouco ajudou sua causa. Sem armamentos e totalmente desmoralizados, os
republicanos evacuaram Caracas no julho seguinte, menos de um ano depois da
entrada triunfal de Bolívar. Vinte mil civis arrastaram-se para leste, com
muitos morrendo no caminho. Bolívar fugiu para Cartagena, onde uma vez mais
ofereceu seus serviços à rebelião em Nova Granada.
Mas a situação política mudara. Napoleão
fora para o exílio e, na Espanha, o restaurado rei Fernando estava decidido a
disciplinar suas teimosas colônias. Uma força espanhola de quase 11 mil soldados
chegou à Venezuela na primavera de 1815, ocupando Caracas e depois partindo para
Cartagena. A cidade caiu após um sítio terrível que matou de fome a maioria de
seus habitantes.
A queda de Cartagena marcou o nadir da
revolução. Bolívar, que fugiu para a Jamaica, tomou da pena e purgou seu
sentimento de fracasso com outro manifesto político. Na Carta da Jamaica, de 1815, defendeu novamente um governo central forte.
“As instituições plenamente representativas não se adequam a nosso
caráter", afirmou ele, propondo um presidente vitalício como cura para os
divisionismos da jovem república. Ao mesmo tempo, exprimia o desejo de ver toda
a América do Sul unida sob um “congresso de representantes das repúblicas,
reinos e impérios que discutiriam a paz e a guerra com o resto do mundo”. Era
uma ambição que ele perseguiria pelo resto da vida.
Reencontrando-se com seus companheiros
revolucionários no Haiti, tentou uma nova invasão da Venezuela na primavera de
1816. Foi um fracasso dispendioso; mas irrefreável, Bolívar partiu para uma
nova tática no final do ano.
Estava ficando cada vez mais claro que
seria difícil invadir a populosa e bem-defendida faixa litorânea da Venezuela.
Bolívar decidiu então entrar pelo vale do Orenoco, um rio imenso que
serpenteava por florestas e llanos
até o oceano Atlântico. Mal defendido pelos espanhóis, o terreno impenetrável
oferecia aos republicanos um lugar para consolidar suas forças e formar uma
ordem estável de comando que faltara em campanhas anteriores. Em Angostura,
cidade ribeirinha de 6 mil habitantes, situada a 320 quilômetros da costa, os
patriotas fizeram seu quartel-general e conquistaram uma base permanente em sua
terra natal.
A primeira tarefa de Bolívar foi a de se consolidar
como comandante supremo. Mariño recusava-se novamente a cooperar. Mais perigoso
ainda era Manuel Piar, um general mulato que planejava abertamente uma
rebelião. Bolívar mandou prendê-lo. Submetido à corte marcial, Piar foi
executado. Mais tarde, Bolívar sustentou que esse ato salvara o país: “Nunca
houve uma morte mais útil, mais política e, ao mesmo tempo, mais merecida".
Por sua vez, Mariño dobrou-se diante dessa exibição de força, jurando fidelidade
às autoridades republicanas de Angostura.
Piar representava o perigo de divisão racial
do movimento republicano. Ressentido diante dos privilegiados criollos e humilhado pelo estigma de seu
sangue misto, ele tentara atrair a grande massa de pardos e escravos para um exército separado. Isso teria sido fatal
para a estratégia de Bolívar, bem como um golpe em seu idealismo.
Ao contrário de grande parte dos criollos, Bolívar era um libertário
sincero. Um povo que estava lutando para se libertar, argumentava, não podia em
sã consciência conviver com o “manto negro da escravidão bárbara e
profana". Ao mesmo tempo, compartilhava do medo dos brancos privilegiados
de um levante das raças oprimidas. Acreditava que a única maneira de desarmar a
bomba relógio da injustiça racial era a reforma política. As iniciativas
liberais, sustentava, já tinham transformado a sociedade nas áreas republicanas
da Venezuela. “A odiosa distinção de classes e cores já não foi quebrada para
sempre?" - perguntou a suas tropas após a execução de Piar. ”Não dei
ordens para que a propriedade nacional fosse distribuída entre vocês? Não são
vocês iguais, livres, independentes, felizes e respeitados? Piar podia dar-lhes
mais? Não. Não. Não."
Sob essa retórica altissonante - Bolívar
sabia - jazia a realidade da exploração racial. O próprio Libertador não Iibertara
seus escravos (embora fosse fazê-lo mais tarde, em 1821). Muitos de seus
companheiros republicanos jamais pensariam seriamente nisso e só com muita
relutância estenderiam os privilégios legais aos pardos. Contudo, as massas de cor da Venezuela eram necessárias
para o exército republicano. Para satisfazer ao mesmo tempo as necessidades
militares e suas genuínas simpatias libertárias, Bolívar prometeu liberdade aos
escravos negros que se alistassem com os patriotas. Poucos juntaram-se às
fileiras, mas ao oferecer-lhes liberdade ainda que condicional, Bolívar ajudou
a desarmar um inimigo potencialmente perigoso. Os pardos, no entanto, deram resposta mais positiva às promessas de
oportunidades iguais de promoção, em especial porque o corpo de oficiais das
forças espanholas não oferecia tal incentivo.
Surgiu então um novo e valioso aliado dos
republicanos nos llanos a oeste de
Angostura. Tomás Boves morrera em batalha, mas os llaneros tinham encontrado outro líder em José Antonio Páez, um
enorme e analfabeto criollo que fora
para os llanos fugido da justiça aos
15 anos de idade. Um gênio da guerra de guerrilhas, “Tio Antonio” regozijava-se
com a violência e afirmava ter matado setenta homens com suas próprias mãos.
Sujeito a ataques epiléticos em batalha, era escoltado por um negro gigantesco
conhecido como El Primo Negro, que carregava seu senhor para longe quando
sofria um ataque. Páez entendeu-se imediatamente com Bolívar quando os dois se
encontraram, em 1818.
Se os llaneros
representavam um dos extremos do exército republicano, os redcoats britânicos compunham o outro. Ardente anglófilo que havia
muito tentava atrair o apoio econômico e militar da Grã-Bretanha para as
guerras de independência, Bolívar procurou recrutar um exército privado nas ilhas
britânicas. O momento era certo. Entediados e empobrecidos pela vida civil após
anos de guerra na Europa, milhares de veteranos britânicos responderam ao chamado
de Bolívar. Vestidos de modo absurdo e mal-informados sobre a natureza da
guerra, muitos desses mercenários desertaram ou morreram de doenças tropicais.
Alguns, porém, ficaram com Bolívar ao longo da campanha, criando uma ligação
pessoal ao homem e a sua causa. Da Inglaterra vieram também suprimentos, armas
e equipamentos, comprados a crédito por agentes de Bolívar em Londres.
A 15 de fevereiro de 1819, um congresso de
representantes eleitos ouviu Bolívar fazer um discurso tipicamente agitador em
Angostura. Aos 35 anos, estava no auge de suas forças. Tinha o rosto magro e
pálido, as maçãs saltadas e nariz aquilino. De constituição franzina, media
1,67 metro, mas parecia crescer quando se dirigia à multidão. Segundo seu rival
Mariño, a eloquência dele era de tal ordem que “poderia convencer as pedras da
necessidade de sua vitória”.
No Congresso de Angostura, Bolívar propôs
uma constituição para a Venezuela. Coerente com seu crescente ceticismo em
relação às assembleias populares e seu medo da desunião, sugeriu um senado
hereditário, ao estilo da Câmara dos Lordes da Grã-Bretanha. Pedia a união de
Venezuela e Nova Granada em um único estado a se chamar Colômbia, que mais
tarde seria batizado de Grã-Colômbia. Com mais da metade da Venezuela ainda em
mãos realistas, sua proposta deve ter parecido extravagante, mas Bolívar era irresistível.
No dia seguinte, o Congresso elegeu-o presidente da Terceira República
venezuelana.
Bolívar deu início então a uma das mais
notáveis campanhas da guerra. Ele e Páez não estavam fazendo progressos contra
o poderoso exército espanhol ao norte. Por que não mudar o cenário da ação
completamente? A 23 de maio de 1819, Bolívar convocou seus generais para um
conselho de guerra. Sentados sobre crânios de gado numa cabana em ruínas, eles
concordaram em invadir Nova Granada através dos Andes.
Estavam na estação das chuvas, pior ocasião
para viajar pelos afluentes transbordantes do Orenoco. Para chegar até o pé da
montanha, o exército já teve de enfrentar dificuldades extraordinárias.
“Durante sete dias, marchamos com água pela cintura”, escreveu Daniel Florencio
O'Leary, ajudante irlandês de Bolívar. Canoas de couro transportavam armamentos
e os soldados que não conseguiam atravessar a nado os trechos mais fundos.
Então chegaram às montanhas. Para os homens da planície tropical do Orenoco,
atravessar os Andes foi uma experiência aterrorizante. Caminhando penosamente
sobre rochas pontiagudas, com as botas em tiras, ou montados em cavalos
cambaleantes até a morte, eles penetraram em nuvens geladas. A fim de aumentar
o elemento surpresa, Bolívar escolhera a pior rota para a travessia: o páramo de
Pisba, um platô árido de até 4 mil metros de altitude, considerado intransponível
na estação chuvosa. Foi quase o que aconteceu. Todos os cavalos e bois
morreram. Então os homens começaram a cair, alguns de frio, outros de mal das
alturas, alguns de puro cansaço. Dos 3 mil soldados que começaram a jornada, menos
da metade chegou ao outro lado.
No
início de julho, o exército de Bolívar desceu das montanhas, surpreendendo completamente
os espanhóis de Nova Granada. Os camponeses saudaram com entusiasmo os republicanos,
deram-lhes alimentos e roupas, cavalos e mulas. Muitos se apresentaram
voluntariamente para servir a Bolívar, outros foram recrutados na ponta da
arma. Assim revitalizado, o exército venezuelano atacou os espanhóis com um
ânimo avassalador. Até os mercenários europeus foram afetados pela febre do
patriotismo. “Viva la pátria!” - gritou o coronel Rooke, da Legião Britânica,
em seu leito de morte, erguendo o braço amputado.
A 7 de agosto de 18 19, no vale do Boyacá, uma
força de 2 mil republicanos confrontou-se com 3 mil realistas numa batalha que
decidiu o destino do continente. Cerca de 1600 realistas foram feitos
prisioneiros, junto com o general comandante e seu estado-maior. Os ventos da
revolução tinham mudado. Bogotá, principal cidade da Nova Granada, recebeu Bolívar
com arcos do triunfo e procissões floridas. O Libertador voltou então para
Angostura com a notícia de sua campanha vitoriosa. Antes de partir designou o
general Francisco de Paula Santander para vice-presidente da Nova Granada, uma
decisão que se revelaria fatal.
Naquele mesmo ano, em Angostura, Bolívar conseguiu
o que descrevera como a ambição de sua vida. A 17 de dezembro de 1819, o
parlamento venezuelano estabeleceu oficialmente a República da Colômbia, estado
composto por Venezuela, Nova Granada e Equador. É verdade que nenhum dos três
países estava completamente livre de tropas espanholas, mas os republicanos
estavam confiantes e, além disso, a Europa vinha agora em auxílio de Bolívar.
Após uma revolução liberal na Espanha, o
general Morillo, comandante-em-chefe das forças realistas na Venezuela, recebeu
instruções de negociar com Bolívar. Morillo espantou-se com a aparência modesta
de seu oponente. “Aquele homem pequeno de casaco azul e chapéu de campanha
sentado na mula!” - exclamou. “Aquele é Bolívar?” Mas a eloquência do líder
republicano conquistou-o. Naquela noite, os dois dormiram no mesmo aposento e
separaram-se como irmãos. Após esse encontro - uma das vitórias mais notáveis
de Bolívar sobre a Espanha -, Morillo pediu para deixar o comando e voltou para
a Europa. O armistício de seis meses durou apenas cinco, pois os republicanos
aproveitaram sua força crescente para retomar as hostilidades. A 24 de junho de
1821, ganharam finalmente a batalha pela Venezuela na planície de Carabobo,
perto de Valência, e uma vez mais Bolívar entrou vitorioso em Caracas.
Embora a Venezuela ainda não estivesse em
paz, o Libertador estava ansioso para completar seu sonho de uma Colômbia unida
com a liberação do Equador, território ao sul de Nova Granada. Já tinha enviado
seu melhor general, Antonio José Sucre, para iniciar a campanha. Agora corria a
ajudá-lo. No outono de 1821, quase de passagem, aceitou a presidência da
Colômbia do recém-reunido Congresso de Cúcuta, na Nova Granada. De novo, fez de
Santander seu vice-presidente.
Guayaquil, principal porto do Equador, já
tinha declarado sua independência. A capital montanhosa de Quito resistiu
ferozmente ao ataque republicano, mas caiu para Sucre em maio de 1822. Enquanto
isso, o exército de Bolívar forçara seu caminho para o sul após lutas sangrentas
nas passagens dos Andes. Em julho de 1822, o Libertador entrou em Guayaquil e
voltou novamente seus olhos para o sul: o Peru.
A pressa de Bolívar em libertar o Equador
era apenas parcialmente motivada pelo amor à liberdade. Ele estava convencido
de que a revolução no norte só estaria consolidada quando os espanhóis fossem
derrotados no sul. Queria também que Guayaquil, com seus estaleiros e porto
natural, ficasse como estado colombiano, sem ser absorvido pelo Peru. E estava
com ciúmes do único homem do continente cuja fama ombreava-se com a sua: José
de San Martín.
San Martín era argentino e passara sua
juventude na Europa, servindo com distinção ao exército espanhol. Inspirado pelas
notícias de rebelião em sua terra, retornara para Buenos Aires em 1812 e
oferecera seus serviços aos patriotas do Prata.
Naquele momento, o país estava em
desordem. O vice-rei fora expulso e instalara-se um governo criollo dois anos antes. Com uma sucessão
de ditadores de vida curta tentando ganhar apoio de facções regionais, as
províncias do Prata estavam difíceis de governar e impossíveis de unir. O Alto
Peru continuava realista; o Paraguai repudiara a autoridade externa para se
tornar um estado soberano em 1811; e do outro lado do rio da Prata, a província
da Banda Oriental - atual Uruguai – lutava pela independência tanto contra
Buenos Aires como contra os portugueses do Brasil.
Para essa terra anárquica San Martín
trouxe uma devoção desprendida pela liberdade e um gênio para a organização
militar. Seu valor foi logo reconhecido pelo governo, que lhe confiou a missão
de proteger o país contra uma invasão espanhola. Tal como Bolívar, San Martín
reconhecia que a independência de seu país - declarada oficialmente em 1816 -
estaria sempre ameaçada enquanto Chile e Peru continuassem em mãos espanholas.
Em consequência, San Martín devotou mais de dois anos equipando e treinando o
que descreveu como “um pequeno exército disciplinado", em Mendoza, junto
aos Andes. Seu objetivo era impressionantemente simples: atravessar os Andes,
libertar o vizinho Chile e depois navegar para o norte a fim de conquistar o
Peru.
A arquitetura herdada da Espanha domina a praça da Independência, em Santiago, capital da república chilena, tal como foi representada numa ilustração do Atlas do Chile de Claudio Gay. |
Nessa empreitada audaciosa, San Martín foi
ajudado por patriotas chilenos, que tinham fugido para o leste quando as tropas
espanholas esmagaram seu desunido exército de independência. Entre eles,
destacava-se Bernardo O'Higgins, cujo pai irlandês fora promovido, contra as
probabilidades, de comerciante aventureiro a vice-rei do Peru. Em tenra idade, Bernardo
encontrara Miranda em Londres e entrara para o campo revolucionário. Como
comandante-em-chefe do exército patriota chileno, O'Higgins perdeu
decisivamente para os espanhóis em 1814, derrota precipitada pelo ressentimento
de outros líderes nacionalistas. Agora, unia-se a San Martín em Mendoza e
preparava-se com entusiasmo para libertar sua terra natal.
Em janeiro de 1817, San Martín e O'Higgins
começaram a escalada dos Andes. Do inicio ao fim, toda a operação foi
meticulosamente planejada e levada a cabo. Uma força de cerca de 5 mil homens -
junto com artilharia, comboios de suprimentos e rebanhos de gado - cruzou essa
tremenda barreira natural por quatro desfiladeiros separados, em apenas vinte
dias, suportando altitudes de mais de 3 500 metros e depois se reunindo
exatamente como planejado no lado chileno das montanhas. Os espanhóis, que
tinham recebido informações falsas sobre a tática de San Martín, foram
surpreendidos quando esse exército bem-equipado desceu da muralha de rochas e
neve que parecia oferecer tanta segurança. A 12 de fevereiro, os patriotas dizimaram
um exército realista na planície de Chacabuco e, três dias depois, entraram
triunfalmente na capital, Santiago.
Levou mais um ano para que os patriotas
liquidassem a resistência espanhola. Então, com O'Higgins de supremo ditador do
Chile, San Martín voltou-se para a segunda fase de seu esquema de libertação.
Em 1820, sua frota de sete vasos de guerra - comprada, junto com tripulações
mercenárias, da Inglaterra e dos Estados Unidos - partiu para o Peru. Menos de
um ano depois, San Martín instalava-se em Lima.
Mas embora tivessem perdido a capital, os
espanhóis ainda controlavam as ricas regiões montanhosas do interior. San
Martín não tinha ilusões de que poderia submeter o resto do Peru com a mesma
facilidade da conquista do Chile. Apesar da insistência de lorde Cochrane, seu
almirante britânico, San Martín escolheu evitar o confronto militar. “Quero que
todos os homens pensem como eu”, escreveu ele, enfatizando seu desejo de
persuadir em vez de coagir a população.
Não conseguiu nem uma coisa nem outra. Embora
muitos peruanos aderissem à causa nacionalista, eles não se uniram sob seu
"Protetor", como San Martín chamava a si mesmo. Alguns tinham inveja
do poder que aquele estrangeiro assumira; outros, republicanos dedicados,
ficaram irados com sua intenção confessa de estabelecer uma monarquia
constitucional no Peru. Além disso, sua posição militar estava ficando
precária: rompera com a liderança caótica de Buenos Aires, que se opusera a sua
campanha no Peru e estava perdendo o apoio de muitos de seus oficiais, que lhe
atribuíam ambições ditatoriais. Enquanto isso, o exército espanhol se reagrupara
nos Andes. Mas havia uma esperança ao norte: Simon Bolívar estava lutando no
Equador. Com a ajuda do exército colombiano, San Martín esperava esmagar os
espanhóis e impor a ordem política no Peru. Tal como Bolívar, também estava tentado
pelo próspero porto de Guayaquil. “Vou me encontrar com o Libertador da
Colômbia”, anunciou ele, e partiu para o norte.
Os dois homens encontraram-se em Guayaquil
a 26 de julho de 1822. Bolívar, que já se declarara ditador da cidade, não
estava para fazer concessões ao rival. Na noite seguinte, após outro dia de
discussões infrutíferas, San Martín escapuliu de um baile comemorativo e partiu
para Lima. Dois meses depois, resignou ao comando supremo e deixou o país.
Taciturno e orgulhoso, deu poucas explicações para sua retirada. “Estou cansado
de ser chamado de tirano”, disse ele. Morreu em Boulogne, na França, em 1850.
O caminho estava aberto para Bolívar
libertar o Peru. Seria um empreendimento solitário. As forças de San Martín
tinham se dissolvido e o almirante Cochrane levara sua frota para o sul, a fim
de atacar navios espanhóis por conta própria. Além disso, no Chile, os últimos
seis anos tinham mostrado um O'Higgins muito simpático, mas político incapaz.
Ele era um igualitarista fervoroso, ansioso para aplicar seus princípios
através de um governo forte. “Se não ficarem felizes com seus próprios esforços”,
disse ele de seu povo, “devem ficar felizes à força; por Deus, eles têm de ser
felizes”. Para tanto, aboliu todos os títulos espanhóis, confiscou terras dos realistas
e reformou o sistema tributário para financiar melhoras na educação e nos transportes.
Mas seu tipo de despotismo esclarecido não era apreciado por todos. No sul
subdesenvolvido, o ressentimento diante dos altos impostos resultou em continuada
guerra debilitadora. Além disso, suas reformas enfureceram tanto os
terratenentes criollos quanto o
clero. Em outubro de 1822, a proposta de O'Higgins de uma constituição que lhe
daria poderes virtualmente ditatoriais para a década seguinte foi a gota
d'água. No ano seguinte, seus oponentes forçaram-no a renunciar e fugir para o
Peru. Nos anos de caos que se seguiram, enquanto uma série de presidentes de
curta duração tentava controlar o país desunido, o Chile teve pouco tempo para
se preocupar com os eventos do Peru.
Impávido, Bolívar foi para Lima em agosto
de 1823, encontrando o Peru em um estado de desorientação política e colapso
militar. ”O país sofre de uma pestilência moral", escreveu ele. Sofria também
com os espanhóis: em fevereiro de 1824, quando Bolívar foi nomeado oficialmente
ditador do Peru por um governo desesperado, a república só mantinha o controle
de uma única província costeira.
Com a ajuda do general Sucre, Bolívar
conseguiu treinar e equipar uma força de quase 10 mil homens e, em junho de
1824, os dois generais partiram para os Andes. Dois meses depois, derrotavam os
realistas numa escaramuça na planície de Junín. A vitória parecia próxima, mas
em outubro, Bolívar recebeu uma súbita ordem do parlamento colombiano para
abandonar o comando. (O vice-presidente Santander, supôs ele, estava por trás
desse ato.) Sucre assumiu todo o controle e a 18 de dezembro forçou um confronto
decisivo com os realistas em um lugar que levava o nome indígena de Ayacucho -
Beco da Morte.
Essa batalha quebrou a resistência espanhola
no Peru. Sucre avançou rapidamente até o Alto Peru, onde derrotou os realistas
em abril de 1825. Foi a última batalha que a Espanha travou no continente
sul-americano. Em agosto, o Alto Peru declarou sua independência, adotando o
nome de Bolívar (mais tarde Bolívia), tendo Sucre como primeiro presidente.
Bolívar, que não participara pessoalmente da luta final, chegou em triunfo e subiu
o monte Potosí com Sucre para celebrar o final da guerra contra a Espanha. Ela
ainda conservava suas possessões no Caribe, mas a libertação da América do Sul
estava completa.
Com o fim da luta pela independência, começava
a batalha pela estabilidade do futuro do continente. Desta vez, o Libertador
não conseguiria vencer.
Bolívar assumiu o papel de conselheiro da
nova república boliviana, assessorando numa ampla variedade de assuntos, de agricultura
e comércio até higiene e criação de lhamas. Para auxiliar no programa educacional,
chamou seu velho tutor Simón Rodríguez (logo banido do país devido a seu
comportamento sexual desinibido). Mas a principal e mais controvertida
contribuição de Bolívar foi a própria constituição, um documento altamente
pessoal que refletia sua crescente desilusão com a democracia. Embora
garantisse os direitos humanos e abolisse a escravidão, seu texto previa também
a criação de um presidente vitalício que teria o poder de designar seu próprio
sucessor.
As eleições, explicou Bolívar, “só produzem
anarquia". Sentia-se imensamente orgulhoso da constituição boliviana. Sob
sua influência, o Peru adotou-a em 1826 e Bolívar exortou a Colômbia a fazer o
mesmo. “Todos vão considerar essa constituição como a arca da aliança",
afirmou irrefletidamente. Na opinião de seus oponentes, ela se parecia mais com
o bezerro de ouro.
Chegou então o momento de Bolívar realizar
sua ambição maior: uma confederação de todos os estados das Américas do Sul e
Central. Todo o continente meridional estava livre do domínio europeu. México e
Guatemala - que então abrangia, além do país atual de mesmo nome, El Salvador,
Costa Rica, Honduras e Nicarágua - tinham conquistado a independência em 1821. E
o Brasil tinha se declarado uma monarquia constitucional, independente de
Portugal, no ano seguinte. Bolívar propunha então a formação de uma liga de nações
que arbitraria as disputas que ocorressem entre os países, aboliria a discriminação
racial e providenciaria a defesa mútua. Para lançar o projeto, convidou delegados
de todas as novas nações (e de Inglaterra e Estados Unidos) para uma reunião no
Panamá, que acabava de se declarar independente.
O congresso resultante de 1826 foi um
fracasso que chegou às raias da farsa. Agora que eram independentes, as nações
americanas estavam mais preocupadas em resolver seus problemas domésticos do
que em iniciar qualquer ação conjunta. Alguns países nem mandaram delegados,
outros chegaram tarde demais. O representante dos Estados Unidos morreu em
viagem ao Panamá, enquanto o próprio Bolívar ficava no Peru. No fim, apenas
quatro países - México, Colômbia, Peru e Guatemala - participaram. Suas
resoluções tiveram pouca consequência e, de qualquer forma, foram logo esquecidas
diante do tumulto que tomou conta da Colômbia.
Na longa ausência de Bolívar, pioraram as
relações entre Santander e o llanero Páez,
agora comandante geral da Venezuela. Com efeito, os venezuelanos estavam em pé
de guerra quando Bolívar retornou a Bogotá, no final de 1826. O Libertador apressou-se
em resolver as diferenças entre os dois homens, mas mal dera as costas para
Lima, e os soldados de Nova Granada que tinham ficado para manter a ordem rebelaram-se
contra seus oficiais venezuelanos e voltaram para casa. Os políticos peruanos
imediatamente jogaram fora a constituição de Bolívar e devolveram o país ao
estado de caos no qual aparentemente eles prosperavam. Os sonhos de unidade do
Libertador pareciam cada vez mais distantes.
Em seus esforços para restaurar a ordem na
Colômbia, Bolívar começou a defender soluções ainda mais autoritárias. “Sem
força não há virtude", anunciou ele. “Que tenhamos leis inexoráveis".
Suas ideias, no entanto, só serviam para distanciá-lo ainda mais dos liberais.
Em 1828, o governo constitucional rompeu-se e Bolívar assumiu poderes
ditatoriais. No mesmo ano, seu desapontado rival Santander, tendo maquinado um
atentado fracassado contra Bolívar, exilou-se.
Mas a posição do Libertador tornava-se
precária. Aferrou-se ao poder por mais um ano e meio, período em que sua
popularidade declinou e sua saúde deteriorou-se. O Peru, que já havia expulsado
Sucre da Bolívia, invadia agora o Equador. O ataque foi rechaçado, mas a
Venezuela de Páez rebelou-se e separou-se da Colômbia. A união de Bolívar
esfacelava-se. Enquanto os venezuelanos o repudiavam, políticos e generais de
Nova Granada consideravam-no um risco. Os liberais difamavam-no, temerosos
ainda de que acabaria assumindo poderes tirânicos.
Bolívar renunciou à presidência e, a 8 de
maio de 1830, deixou Bogotá, decidido a emigrar a fim de fugir do divisionismo
debilitador da América do Sul. Mais golpes o esperavam. Antes de chegar à costa,
recebeu a notícia de que o Equador declarara sua independência, destruindo
assim o último vestígio do sonho colombiano. Depois ficou sabendo que Sucre, o
mais leal e capaz de seus generais, fora assassinado numa estrada montanhosa do
sul da Colômbia.
Devastado fisicamente pela tuberculose e
mentalmente pelo colapso da obra de sua vida, Bolívar perdeu toda a esperança
no continente. Seu último pronunciamento um mês antes de morrer, revelou sua
desilusão: “A América é ingovernável. Os que servem à revolução aram o mar. A
única coisa a fazer na América é emigrar”.
Bolívar morreu a 17 de dezembro de 1830,
numa quinta perto de Santa Marta, no litoral caribenho de Nova Granada. Doze
anos depois, quando finalmente amainou o ódio que o Libertador inspirara na
Venezuela, seu corpo foi levado de volta para Caracas e enterrado em sua terra
natal.
Os anos imediatamente posteriores à morte
de Bolívar confirmaram sua mensagem final. Os sonhos de cooperação
internacional e unidade continental afundaram numa onda de violência e cobiça.
Venezuela, Nova Granada - mais tarde rebatizada de Colômbia - e Equador foram
convulsionados por guerras civis sangrentas. A Bolívia invadiu o Peru, o Chile
entrou em guerra com os dois países. Em vez de constituições, a política da
América Latina teve caudilhos. A convicção de Bolívar de que os presidentes
deveriam ser vitalícios gerou uma progênie maligna de ditadores.
A longa e dura estrada da independência não
levara à liberdade. Os criollos
tomaram o lugar dos peninsulares como
classe política dominante, sem abandonar nenhum dos privilégios. As prometidas
reformas agrárias deram em nada. Enormes haciendas
continuaram a dominar a economia rural, com um pequeno grupo de criollos novos-ricos tomando as
propriedades dos peninsulares. Poucos
sofreram tanto quanto os índios, cujas terras comunais foram cinicamente
absorvidas pela nova elite, sob o pretexto de integrar seus donos tradicionais
à república.
O vácuo econômico criado pela saída da
Espanha foi preenchido pela Inglaterra e outras potências europeias, cujos
interesses eram igualmente egoístas. Em 1823, os Estados Unidos tinham lançado
a doutrina Monroe, uma declaração unilateral que afirmava que qualquer
tentativa da Europa de oprimir ou controlar governos independentes do
hemisfério ocidental seria considerada um ato de inimizade. A América do Sul,
porém, continuava à mercê dos tentáculos mercantis do Velho Mundo. Com efeito,
o próprio Bolívar chegara a sugerir ao governo peruano a venda “na Inglaterra
de todas suas minas, terras, propriedades e outros bens do governo para cobrir
a dívida nacional”. Agora, uma torrente de produtos manufaturados baratos da
Europa caía sobre o continente em troca de matérias-primas. Mas enquanto os criollos abastados podiam se dar ao
luxo de adquirir bens de consumo dos centros industriais da Grã-Bretanha, os
trabalhadores das minas e plantações continuavam a viver na miséria.
Em toda a América Latina, a sociedade
continuou profundamente dividida por distinções de raça e cor. As belas
palavras dos abolicionistas foram logo esquecidas. Em países como Argentina,
Colômbia, Venezuela e Peru, cujas economias ainda comportavam o trabalho
forçado, a escravidão só seria abolida na década de 1850. Outros trabalhadores
continuaram a viver em condições de quase escravidão, presos à terra por
dívidas ou desesperança.
Mas as guerras de libertação não foram
travadas inteiramente em vão. Os nomes de Boyacá e Ayacucho, Sucre, O'Higgins e
San Martín seriam lembrados com admiração reverente, enquanto Simón Bolívar se
tornaria um semideus, uma geração após sua morte. Os feitos e ideais do
Libertador e seus companheiros revolucionários permaneceram como inspiração
para os espíritos rebeldes que viriam no futuro, para quem a visão de um povo
latino-americano livre jamais feneceria.
LIBERTAÇÃO DA AMÉRICA LATINA é um capítulo do livro A FORÇA DA INCIATIVA, da coleção HISTÓRIA EM REVISTA, que trata temas ocorridos entre os anos de 1800/1850.
Os demais capítulos são O IMPÉRIO DE BONAPARTE, A INDÚSTRIA NA GRÃ-BRETANHA, A ABERTURA DA CHINA e O SUL DA ÁFRICA EM DISPUTA.
Editores de TIME-LIFE LIVROS
ABRIL LIVROS - Rio de Janeiro
Editor da série: TONY ALLAN
Consultor para este capítulo: JOHN LYNCH,
Professor emérito de História Latino-americana
Universidade de Londres
LIBERTAÇÃO DA AMÉRICA LATINA é um capítulo do livro A FORÇA DA INCIATIVA, da coleção HISTÓRIA EM REVISTA, que trata temas ocorridos entre os anos de 1800/1850.
Os demais capítulos são O IMPÉRIO DE BONAPARTE, A INDÚSTRIA NA GRÃ-BRETANHA, A ABERTURA DA CHINA e O SUL DA ÁFRICA EM DISPUTA.
Editores de TIME-LIFE LIVROS
ABRIL LIVROS - Rio de Janeiro
Editor da série: TONY ALLAN
Consultor para este capítulo: JOHN LYNCH,
Professor emérito de História Latino-americana
Universidade de Londres
só me resta dizer uma constatação ... não tivemos o nosso simon bolivar ... quem sabe foi bom para o brasil ...quem sabe ...
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